Levanta-te ou levas
Como consegues olhar a vida nos olhos depois de lhe voltares as costas, depois de optares por um caminho tão diferente daquele que ela nunca escondeu ser o mais acertado?
Percorres essa alternativa em passo acelerado, faz de conta, como se os dias corridos fossem mais fáceis de esgotar, como se assim fosse mais fácil ignorar a traição à vida que desiludes com a cobardia intrínseca de qualquer deserção. Foges, afinal, quando simulas uma azáfama para te abstraíres, mergulhado até ao pescoço nas consequências da apatia que te veste com pele de cordeiro a revolta que entendeste abafar sob o pretexto mais à mão.
Invocas perante ti próprio, em vão, as desculpas de mau pagador e tentas fintar até o amor que receias como uma fraqueza potencial. O amor capaz de te fazer mal como um obstáculo onde possas dar um tropeção, a corda esticada para mais um trambolhão que te exponha à dura realidade de seres incapaz de te pores de pé logo a seguir.
Coitado de ti, tão massacrado. Nesse asfalto onde jazes tombado mais o orgulho imbecil que tanto acarinhaste ao longo do tempo em que te acreditaste capaz de viver como sabes que devias.
Agora deves à vida uma explicação, diz-lhe nos olhos qual a razão para essa desistência camuflada sob uma existência indigna da pessoa cheia de vontade que um dia te acreditaste capaz de aguentar até ao fim, tal e qual.
Fala comigo, se tens em ti tão firme a convicção de que o teu caminho passa pela solidão enquanto te diriges para lugar algum. Enfrenta a verdade, confronta-a com a tua versão mascarada de uma derrota anunciada no preciso instante em que aceitaste vergar ao peso de uma realidade madrasta, essa capitulação que te arrasta para o fundo sem esbracejares a rebeldia de outrora. Anda, vamos lá para fora e dou-te uma carga de porrada em nome da vida adiada que ultrajas com essa pose decadente e servil.
Afasta os braços do rosto, não te limites a defender esse focinho de cachorro pacato e fiel. Reaprende a seres leal para com contigo mesmo, limpa todo o esterco que te sufoca nessa ira controlada, nessa revolta amestrada, nessa luta interior tão desigual que te transforma aos poucos num perdedor.
Talvez aí redescubras o valor da vida que sonhaste para ti e da qual abriste mão.
Olha-a nos olhos e dá-lhe uma boa razão para tanto desperdício, para essa rotina das perdas que já é quase um vício.
E se nenhuma razão te ocorrer, deixa-te de merdas e manda foder esse caminho de cabras, não tens veia de pastor. O teu destino é rosnar sempre mais forte, sempre mais alto que qualquer adversidade.
É essa a verdade espelhada, como uma alma, nos olhos da vida que está na tua hora de mudar.