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CHARQUINHO

Sedento de aprendizagem, progrido pelos caminhos da vida numa busca incessante de espíritos sábios em corpos docentes. (sharkinho at gmail ponto com)

CHARQUINHO

Sedento de aprendizagem, progrido pelos caminhos da vida numa busca incessante de espíritos sábios em corpos docentes. (sharkinho at gmail ponto com)

26
Jul22

A posta no influencer camuflado

shark

A recente sondagem, chamemos-lhe assim, que coloca o famoso contra-almirante das vacinas como potencial vencedor das próximas eleições presidenciais, logo à primeira volta, diz-nos muito do que vai na alma e do que não deveria ir na cabeça dos portugueses.

O militar em apreço teve um desempenho notável num momento sensível, aplicando métodos simples de organização e de disciplina que a sociedade civil parece não dominar. Recebeu um cargo que ambicionava e o reconhecimento quase generalizado por parte da população, em troca dos serviços que nos prestou. Mas é um militar de alta patente, sem qualquer bagagem política e completamente anónimo até surgir uma circunstância propícia para o catapultar em direcção à ribalta. Cumpriu bem aquele papel, nada garante que a receita ganhadora possa replicar-se em todos os domínios em que um Presidente da República possa intervir.

O que a dita sondagem deixa claro é a permeabilidade ao apelo de índole populista, similar aos que têm conduzido ou perpetuado no poder líderes sem maneiras ou sem Sentido de Estado um pouco por todo o Mundo. Esse impulso irreflectido de ceder ao papão do caos que, num dos países mais seguros, mais estáveis e mais antigos da Europa, já levou à eleição de vários deputados de uma seita que se pinta como partido para corroer por dentro a Democracia.

Desencantados com a debilidade das lideranças que se expõem sistematicamente em casos mediáticos de corrupção, de compadrio, de criação de "cortes" que as afastam de uma leitura correcta do que se passa no país, basta um exemplo bem sucedido para deslumbrar. De preferência com um ar austero, como um oficial da Marinha ou assim.

Faz-me lembrar o exemplo clássico do grupo desorientado que escolhe como líder o primeiro gajo na sala a levantar a mão e que afinal só queria saber se podia ir fazer chichi a meio da reunião.

Assusta-me, esta flexibilidade de critérios baseada na política tiririca (pior do que está não fica). A complexidade inerente à condução de um país não pode ser confiada a quem ainda nem tirou a carta de ligeiros em matéria de compreensão das imensas partes de que o todo se compõe.

10
Out19

Está na hora de atinar

shark

Só foge para os extremos quem não encontra soluções no centro. Run for cover, o mesmo apelo que levou à eleição de Trump e à vitória do Brexit num referendo, abre caminho ao estilo de discurso que fez eleger André Ventura para o nosso Parlamento. Desencantadas pelas vigarices praticamente impunes que atrofiam o país e pelas promessas por cumprir num contexto do salve-se quem puder partidário, as pessoas já nem procuram respostas: buscam réplicas das suas questões por responder. E são essas que os populistas lhes entregam de bandeja, desabafos prontos a consumir e o ombro amigo da voz grossa que só promete o fim de coisas, sem propôr qualquer alternativa credível em sua substituição. Talvez uma autocracia, não incluída no menu principal.

 

Existem reformas indispensáveis por cumprir, por falta de vontade política - queremos todos acreditar nesse pecado menor - ou por efectiva incapacidade para solucionar alguns problemas que um mundo em evolução acelerada acarreta, o cenário mais aterrador porque empurramos para a frente com a barriga os embriões de broncas que nos irão empurrar para um precipício no futuro. Já tivemos um vislumbre do que isso pode implicar para uma família comum, na ressaca da crise mundial que nos destapou a careca de um Estado ineficaz a gerir as suas (também nossas) contas, de uma vulnerabilidade brutal do sistema político face às trapaças do sistema financeiro e mesmo da sua descarada conivência com as mesmas.

Neste contexto, quase faz sentido que no terceiro país mais seguro do planeta as pessoas amedrontadas por uma realidade local específica optem pelo vozeirão que lhes promete segurança, mesmo que nada ofereça em troca para garantir a confiança na sua capacidade para fazer melhor quando se trata da realidade de todo um país. Como, de resto, é explicável que pessoas com escassa formação, alheadas por este ou aquele motivo da realidade para lá da sua, votem por simpatia clubística, em protesto contra o sistema ou apenas porque se deixam impressionar pela rudeza apelativa de um discurso que destoa daqueles que tentem pautar-se por alguma sensatez.

 

Outra postura

 

À esquerda, à direita ou assim-assim chegaram ao país político diversos sinais de uma sede de mudança ainda letárgica, sem rumo definido, mas esclarecedoras acerca da atenção que cada vez mais pessoas se vêem obrigadas a prestar às pequenas alternativas. O Chega, pelo radicalismo, terá sido o mais visível, mas a Iniciativa Liberal personifica igualmente uma faixa de cidadãos que acredita ter encontrado as tais respostas e soluções em falta, nomeadamente através do recurso à tecnologia avançada que hoje substitui as antigas caixas registadoras. Como o PAN já havia indiciado, com a sua aposta num segmento de mercado, o da ecologia e do ambientalismo, cujos potenciais eleitores não se revêem na timidez da actuação dos partidos tradicionais e acabam por confiar a sua capacidade de decisão a quem não faz a mínima ideia de como gerir um país só por se ter especializado em canis.

 

O Chega é apenas o lado mais sombrio de uma apatia desencantada, de uma revolta fabricada pela soma dos diversos desconfortos devidamente enfatizados por quem saiba ao que vem. Contudo, tal como qualquer proposta vazia de conteúdo ideológico ou de um rumo coerente e realista, sem uma matriz clara, só representa uma ameaça seja para quem for se os berros populistas continuarem a encontrar eco na inépcia de quem detém o poder. Dar um bom exemplo, mais do que nunca, é para os governantes não menos do que um dever. Com lealdade e dedicação à causa pública, com coragem para decidir em vez de adiar, sem espaço de manobra para desleixos ou compadrios, sem mácula num comportamento tão zeloso na moralidade como na legalidade. Tudo o que venha abaixo disto, pelas repercussões possíveis, pelas alternativas terríveis, constituirá pouco menos do que uma traição ao país e à própria democracia.

27
Set16

Quanto mais me debates menos gosto de ti

shark

Embora tivesse falhado na intenção de assistir em directo ao primeiro debate das presidenciais americanas, claudicando ainda antes do seu início tardio, reuni a coragem para o ver na íntegra em diferido.

Confirmou-se a minha aposta de que seria a versão western de um hipotético Maria de Belém vs Alberto João Jardim.

 

Nunca fui adepto da política espectáculo, do circo no qual as propostas políticas constituem apenas um detalhe no meio da palhaçada. Igualmente dispenso a euforia palerminha dos balões e bandeirolas que mobiliza militantes, empresas da mais diversa ordem e toda uma estrutura partidária na construção de uma imagem. De uma imagem e não de uma ideia. No fundo, sinais de investimento em meios e em energia para uma operação de maquilhagem à medida dos interesses mediáticos porque, subentende-se, é mais importante divulgar o aparato de uma campanha do que alguma proposta digna de alterar a intenção de voto de seja quem for.

Os debates, como as entrevistas aos candidatos, constituem a minha principal fonte de informação acerca, lá está, das pessoas envolvidas, pois raramente consigo apanhar algo de concreto, de substancial, por entre as acusações e insultos cordiais em que quase sempre degeneram os frente-a-frente ou nas entrelinhas de entrevistas antecipadamente preparadas no sentido de trilharem o caminho do politicamente favorável que o politicamente correcto sempre sugere.

Concentro-me por isso, nem que seja para poder aplicar um critério, nas pessoas. Na forma como reagem a quente às várias pressões e no conteúdo com o qual, pelo menos, definem as suas prioridades em teoria. A prática costuma desmenti-las.

O debate Clinton/Trump permitiu-me distinguir um vencedor, que se tratou de uma vencedora, não pela capacidade de argumentação – melhor a dela, menos dada a devaneios – mas pelo facto de Hillary ter podido ser mais Hillary do que Trump se permitiu ser Trump. Ou seja, ela passou o tempo concentrada no judo intelectual e ele, pobre coitado, aguentou-se como se estivesse o tempo todo aflitinho para ir ao WC enquanto a oponente lhe levava os argumentos e a pose ensaiada ao chão. Isso mais umas passagens recíprocas de raspão pelos pés de barro do par de figurões foi o que consegui aproveitar do show. Nada de novo.

 

O que vejo no meio disto tudo é a confirmação de que a ausência de propostas concretas em benefício dos soundbites apelativos é um fenómeno generalizado e reflecte uma degradação do confronto político que, numa época conturbada, deixa a maioria dos eleitores sem respostas.

Embora a maioria já se mostre sem vontade de perguntar.

09
Mar14

A posta pontapeada

shark

O António do talho é um puto porreiro e toda a gente o reconhece nessa condição.

Contudo, um destes dias passou-se com um vendedor de inutilidades e tentou dar-lhe um murro à terceira vez em que o abusador insistiu em entrar no estabelecimento.

A clientela, porquanto surpreendida com a agressividade inédita daquele paz de alma, de imediato o obsequiou com palmadinhas nas costas e tratou de apresentar à restante vizinhança as múltiplas atenuantes capazes de justificar aquele desvario de um moço que até é bom rapazinho.

Compreendo a reacção da malta e congratulo-me por o António não ter perdido o emprego. Porém, esta bonomia deriva não de uma qualquer tolerância para com o gesto irreflectido do jovem mas do facto de estar em causa um cidadão comum a quem o patrão pregou uma desanda e deixou claro que não se repetiria tal situação sem as devidas consequências (que do episódio em causa não resultariam nenhumas).

Em momento algum sancionei a (tentativa de) agressão mas tive em conta quem a protagonizou e o que de facto estava ali em causa.

 

O mesmo comportamento do António tem, aos meus olhos, outra interpretação quando assumido por cidadãos com outro tipo de responsabilidades inerentes ao exercício de determinadas funções.

Ou seja, continua a ser reprovável, mesmo inaceitável, tendo em conta o pretexto, mas acresce a questão de pormenor que não é, de todo, despicienda: alguns cargos implicam não se poder usufruir do mesmo nível de tolerância ao descontrolo momentâneo. Exemplos? Agentes da autoridade, líderes de opinião ou pessoas ligadas à actividade política (pela proximidade aos órgãos do poder).

Em qualquer dos exemplos supra, o diabo está no pormenor de ser exigível a pessoas com responsabilidades acrescidas pela influência do seu desempenho uma conduta irrepreensível em matéria de contenção verbal ou qualquer outra.

 

É para mim incompreensível que um assessor político, um tal de Zeca, possa tratar um fotógrafo à biqueirada e a clientela, neste caso a Comunicação Social, o trate como se fosse o António do talho.

E é para mim intolerável que o patrão do tal Zeca, por acaso o partido no poder, não se tenha sentido obrigado sequer a uma censura pública do comportamento de outro rapazinho bom num dia mau. O tal Zeca está ligado a um partido político, estava a receber um ex-Ministro e agrediu (ou tentou agredir) um profissional da informação.

É um precedente manhoso, sobretudo no actual contexto português e de boa parte da Europa, pela mensagem que transmite. É fácil extrapolar qual será o grau de impunidade de qualquer destes assessores de pêlo na venta num grau mais avançado da conversão em república das bananas levada a cabo pelo actual Executivo, tendo em conta os paninhos quentes colocados por vários jornalistas e o silêncio de quem assim cala e consente, nomeadamente e no caso em apreço, do PSD.

 

Por este conjunto de razões, não alinho no nacional-porreirismo que tanto me orgulha por saber distinguir a gravidade do crime de uma anciã que rouba conservas num supermercado da subjacente a um desfalque bancário capaz de afectar as contas públicas de todo um país, mas que tanto me embaraça quando se mostra ingénuo ao ponto de colocar o António do talho ao mesmo nível do Zeca assessor político no que concerne à responsabilização por incidentes desta natureza.

Uma democracia pode apenas constipar-se pela proliferação dos impulsos violentos entre a arraia-miúda, mas se a coisa alastra até tão perto de quem manda e é direccionada de forma impune contra quem pode denunciar abusos de poder, mais cedo ou mais tarde a pneumonia fatal é garantida.

11
Mai13

A posta que isto já lá não vai com falinhas mansas

shark

No visível desespero dos próprios apoiantes dos partidos da coligação que nos governa, cada vez mais desarmados para acudirem em seu auxílio e com a perda de audiências da presença televisiva de Sócrates a privá-los do renascer das cinzas de um culpado mesmo a jeito para a argumentação fácil, percebe-se o quanto as sondagens até acabam por não reflectir na sua verdadeira dimensão o esboroar absoluto da base de legitimação do actual Executivo.

 

Sejamos claros: já nem a malta de Direita acredita nas hipóteses de sucesso deste grupo heterogéneo de pessoas a quem o poder foi confiado nas circunstâncias que se sabe e de entre a mesma falta de alternativas que nos aguarda em futuros plebiscitos.

Falha-lhes o talento para o jogo político, a credibilidade para a mobilização popular em torno das suas medidas bizarras e, em muitos casos, simplesmente cruéis, a consistência para consolidar uma imagem de força que colmate as várias debilidades da sua forma de controlar o poder e, acima de tudo (e nem quatro Poiares bem maduros conseguem apagar o rasto de imbecilidade deixado pelo inenarrável Relvas), falta-lhes a inteligência que nos poderia valer.

 

Depois de assente o pó da desilusão inicial, os portugueses agitaram-se e quase roçaram a revolta chegando a haver quem temesse uma nova Grécia nas nossas ruas. Claro que foi sol de pouca dura e depressa a população acabou enfraquecida pelo próprio efeito de uma governação desastrada e desastrosa que nos obriga a centrar atenções nas questões mais elementares da sobrevivência. Quase um milhão de desempregados mais outro milhão de reformados (com pensões sistematicamente alvejadas pelos snipers da rapina estatal) a sustentarem famílias inteiras deixam pouca margem de manobra para a contestação.

Agora, encravados entre um Governo muito incapaz e uma oposição pouco convincente, oscilamos no quotidiano entre o encolher de ombros resignado, a gestão in extremis de recursos financeiros depauperados e os fenómenos quase diários de estupefação perante as asneiras, as tiradas idiotas e as medidas controversas (ou mesmo inconstitucionais) de que a Comunicação Social e o seu batalhão de notáveis desertores analistas, maioritariamente da mesma área política da quadrilha liderada por Passos Coelho, nos dão conta.

 

O banana no topo do bolo é uma velha glória dos dias felizes do esbanjamento dos milhões que a Europa nos ofereceu como contrapartida para abdicarmos de boa parte do controlo económico sobre o país. O Presidente da República, esse colosso do anedotário político, deveria constituir a maior esperança para uma solução mas acaba por ser uma das faces mais evidentes do problema: a triste realidade de um poder meio senil que ameaça a Democracia, destruindo-a aos poucos neste caldo em lume brando, num banho-maria de impunidade despudorada, de desorientação mal disfarçada e de um esforço concertado de estupidificação das massas por todos os meios ao alcance da seita de chicos-espertos e de palermas instalados nos diversos poderes.

 

Entregues a uma corja de oportunistas e de mercenários, mergulhamos aos poucos nas trevas da lei da selva, do salve-se quem puder.

E ninguém faz a mínima ideia do quanto neste período negro Portugal já deitou a perder.

24
Mar13

A posta numa alternativa biruta

shark

O porta-voz do PS falou hoje na tv e reafirmou a apresentação de uma moção de censura ao Governo na próxima semana. Por mim, tudo bem.

Contudo, o mesmo porta-voz do PS confirmou o pressuposto de que os socialistas só tencionam chegar ao poder por via eleitoral. Consigo respeitar essa posição, embora me soe estranha no contexto de aflição nacional.

Mas a cereja no topo do bolo, aquele pormenor que há sempre um que me faz perceber que de política não percebo nada, é que o PS justifica a sua moção de censura como uma forma de exigir um governo diferente do actual, presumo que nas pessoas como nas políticas.

Aí eu fico a olhar como o boi para o palácio enquanto rumino a minha incompreensão:

então mas se uma moção de censura visa, para todos os efeitos, derrubar determinado Governo e o PS reclama precisamente um novo Executivo (que só pode, sem eleições, ser de nomeação presidencial e terá que ter em conta a actual composição parlamentar para criar uma base de apoio sólida e que não pode contar com o PS que só quer o poder como resultado eleitoral), então o PS vai apresentar uma moção de censura para pressionar o Cavaco (o Cavaco!!!) e criar as condições para que se possa empossar um novo Governo de Direita constituído por pessoas da confiança do Presidente?”.

21
Mar13

A posta no cultivo das petições imbecis

shark

Admito que estou a prestar mais atenção à balbúrdia cipriota em que a (des)União Europeia se meteu, mas quando percebo nas redes sociais e no impulso neo-peticionista uma reacção histérica, uma “proibição” generalizada a um comentador televisivo, seja qual for, começo a temer o pior em termos de apreço pela Liberdade de Expressão (entre outras) numa população cada vez mais óbvia nos sintomas de uma espécie de demência mansa mas nem por isso menos ameaçadora.

 

Talvez seja um dano colateral da crise, mas os impulsos primários de milhares de cidadãos portugueses são assustadores e denunciam um de dois problemas: ou a malta está mesmo toda a passar-se ou para além de valores cruciais como a dignidade, a honra e similares perdeu-se também o sentido do ridículo.

A reacção desproporcionada de milhares ao anúncio da entrada de Sócrates na RTP na qualidade de comentador foi tão hostil que mais parecia que se tratava de uma ocupação bélica dos emissores para abrir caminho à (re)tomada violenta do poder.

 

José Sócrates é nesta altura um comentador político tão habilitado (sim, eu topei esse sorriso manhoso) como qualquer dos vários – na maioria conotados com o espectro político oposto – já em funções.

Qualquer que seja a opinião dos outros a seu respeito tem todo o direito a expressar a sua. Se tinha pecados políticos expurgou-os nas urnas, derrotado como foi, substituído pelo que se vê. Se tinha pecados criminais expurgou-os na barra dos tribunais e nem uma condenação, uma pena ligeira para mitigar a fúria do povo, se aproveitou.

Nesse caso, quem tem o direito de exigir à RTP que desista dessa escolha? E a que pretexto?

 

Só me ocorre um e é dos mais repugnantes, pois indicia uma mesquinhez quase fascista.

E todos conhecemos a qualidade das colheitas obtidas a partir dessas sementeiras de pura estupidez.

05
Mar13

A posta na democracia indirecta dos recém-chegados de fora do sistema

shark

Gosto sempre de prestar atenção aos figurões que se afirmam alheios à política mas avançam na mesma como candidatos eleitorais.

É o caso de um apregoado independente, Rui Moreira, que surgiu na Invicta como uma espécie de lufada de ar fresco à Direita (a doce brisa do Rio) para contrapor ao curioso mas incompreensível candidato socialista e ao mau da fita, o eterno Luís Filipe Meneses.

Estes figurões mediáticos, sempre sustentados por um qualquer poder (no caso concreto existem claros vínculos clubistas e pode pelo menos pressupor-se a simpatia de um Pinto da Costa por eventual eleição de Moreira), surgem de repente na cena (não) política invocando precisamente a sua relação urticária com os partidos.

 

Consigo entender a distância de Rui Moreira relativamente ao fenómeno político-partidário, do qual também me afastei anos atrás, e não sendo esse o motivo que me leve a olhá-lo com alguma cautela é sem dúvida um factor acrescido para nele prender a minha atenção: precisamente porque são estes arrivistas os menos fiáveis à priori de entre os elegíveis para cargos de maior relevância em qualquer democracia.

A nossa, fragilizada pelo que se sabe, encontra-se escancarada a este tipo de paladino da imagem impoluta do cidadão ainda por conspurcar pela máquina hedionda de estragar pessoas em que os partidos políticos facilmente se pintam aos olhos de gente a passar privações.

 

A atenção que presto a estas pessoas xpto permite-me topar com facilidade as suas incoerências, as suas inconsistências e, esses são de caras, os seus momentos de desatenção imbecil. Sim, imbecil. Não é novidade na cena política e é ainda mais fácil de encontrar nestes candidatos sem tarimba na língua para evitarem confusões.

Este Rui Moreira, um homem cheio de predicados na sua vertente empresarial, parece uma pessoa válida, daquelas que Portugal procura como pão para a boca para colmatar as brechas em matéria de liderança. E acredito que o seja, no meio em que se movimenta e, por exemplo, enquanto comentador em programas acerca de futebol.

 

O lance da grande penalidade

 

Todavia, a um candidato a cargos importantes é legítimo exigir alguma bagagem em termos de ponderação. Foi essa que falhou a Rui Moreira quando, no meio de um programa da RTP (Economix), veio à baila o assunto das eleições em Itália e a reacção do putativo candidato foi espontânea. Talvez demasiado, quando se falou do Grillo que deixou em pânico a classe política desta Europa unida em torno de um vulcão.

Aparte o desdém pelo humorista (como se fosse coisa que se pegue), saltou-me à vista o seu comentário abalizado (de autor de um livro acerca do tema) a propósito da democracia directa.

Nem de comentário se pode apelidar, mas a intervenção do senhor que não é um político nem admite qualquer tipo de filiação partidária resume-se no seu exemplo ilustrativo do que entende por democracia directa: a ideia é as pessoas votarem em casa, pelo Facebook, e agora imagine-se que apanham um homicida de crianças e é colocada a questão: acha que este bandido deve ser condenado á morte? E a pessoa, de forma instintiva, tende a votar a favor.

 

Para não me alongar nem pego pela imbecilidade mais óbvia, a do recurso ao exemplo extremo e impraticável, pelo menos fora de um contexto de absoluto caos no qual da Constituição da República se fizesse tábua rasa. Pego sim pela queda desamparada do demagogo na tentação de equiparar os eleitores a criaturas destituídas de inteligência, de bom senso e de capacidade de decisão. É isso que está implícito na figura do tal votante por impulso, movido apenas pela fúria vingadora do Neandertal a quem a democracia representativa até permite seleccionar de entre uma elite com capacidade superior alguém que fale e decida por si.

 

Se Rui Moreira vier a ser o Presidente da Câmara do Porto, por livre escolha dos eleitores a quem o próprio não confiaria nem uma decisão jurídica (fantástico, num Estado de Direito, mesmo com uma democracia directa, este conceito tão radical) até eu ficarei na dúvida relativamente à pertinência dessa sua opinião.

27
Fev13

A posta que o futuro imediato é uma desconcertante incógnita

shark

Sempre que se coloca a questão de como dar a volta à situação que o país atravessa esbarro numa parede que o raciocínio impõe e dou comigo num beco sem saída.

Em causa está a relação entre a dimensão do problema, nomeadamente do ponto de vista financeiro, e o leque de alternativas disponíveis num cenário eleitoral.

Quando vejo cidadãos mobilizados para as diferentes formas de luta que uma democracia digna desse nome nos faculta entendo perfeitamente as suas razões e, em mais do que um momento, sinto-me compelido a também fazer qualquer coisa.

O problema, e é aqui que de repente me vejo no tal dilema, está na nítida sensação de que derrubar o actual governo (e é esse o mote de todas as manifestações populares acontecidas ou por acontecer) pode confrontar-nos apenas com cenários ainda mais complicados no contexto da aflição generalizada, como o exemplo italiano cuidará de comprovar.

 

Cruzar os braços é sempre uma opção impossível perante a progressiva degradação do tecido empresarial e respectivo impacto no número de gente desempregada que pode apenas recorrer aos mais próximos para se valer e também a maioria desses sente na pele o efeito da austeridade. O consequente efeito bola de neve arrasta até a geração dos avós para o turbilhão e a em termos sociais o país começa a acumular tensões indisfarçáveis que só não eclodiram ainda como o caos nas ruas porque olhamos para os gregos e percebemos que nem essa hipótese resolve seja o que for.

Porém, todos sentimos que urge fazer algo e com a máxima urgência.

 

As opções que nos restam limitam-se a males maiores. A desordem não serve. Eleições antecipadas não resolvem. Não há dinheiro e devemos milhares de milhões, pelo que a dependência externa é total e não é realista equacionar a saída do Euro ou a desresponsabilização relativamente aos compromissos assumidos.

Perante isto, o que fazer?

É aqui que ninguém apresenta sugestões minimamente consensuais. Toda a gente consegue apontar culpados e exigir a respectiva responsabilização. Contudo, nesse lote incluem-se os maiores partidos e só uma minoria leva a sério as opções que restam.

 

Um novo partido, alheio aos já existentes e livre das várias cargas pejorativas, surge no horizonte como a única hipótese no âmbito do sistema democrático que o bom senso recomenda e a racionalidade impõe. Uma alternativa distinta das já existentes, capaz de congregar vontades em torno de um projecto simultaneamente realista e milagreiro, seria nas conjecturas de muitos de nós a aposta ganhadora.

Mas no meio do furor demagogo que a desorientação facilita, quem nos garante que não estaremos a investir numa solução sem pernas para andar ou que, como no exemplo italiano que acima referi, não consiga mais do que tornar-se num estorvo à possibilidade de constituição de uma maioria parlamentar capaz de sustentar uma solução governativa estável?

 

Como baratas tontas, acabamos quase todos paralisados perante tantas dúvidas (legítimas) e o tempo esgota-se ao sabor dos caprichos de cada um dos países de uma União Europeia refém de si própria e do efeito dominó de uma crise em roda livre, sem o amparo federalista.

Ainda assim, e caso queiramos insistir na democracia como opção (não existe outra), só mesmo através da criação de novos partidos, movimentos de cidadãos e quaisquer formas de mobilização organizada de cidadãos poderemos alimentar a esperança no surgimento de uma nova ideologia com propostas exequíveis ou, no mínimo, de alternativas credíveis de liderança.

17
Fev13

A posta num beco sem saída

shark

À liderança bicéfala do Bloco de Esquerda corresponde a gestão bipolar da maioria da classe política e, só não vê quem não quer, de um grande contingente dos seus eleitores.

Prestar demasiada atenção aos discursos de políticos e às reacções populares é meio caminho andado para dividir qualquer mente mais esclarecida em duas partes que se antagonizam. Uma delas insiste em disparar alertas perante a evidente (descarada) dissonância entre a prática governativa mais a da sua oposição que se reparte entre o vai vem neo-frouxo e o agarrem-me senão desgraço-me pseudo radical.

No meio disto tudo andamos nós, os críticos de sofá que falam muito mas fazem népia, os manifestantes só porque sim e depois logo se vê, os ignorantes que refilam sem fazerem ideia contra o quê em concreto e toda uma massa de aflitos a sério e de chorões da treta, uma pasta viscosa, disforme, de gente à beira de um ataque de nervos e sem qualquer esperança possível de sustentar a partir do que se ouve, do que se vê e do que se pode pensar a partir desses elementos dispersos que apenas nos ilustram e alimentam uma perturbadora desorientação.

 

A panaceia inventada pelo BE para colar com cuspo as frágeis ligações entre as suas múltiplas correntes, tentando aguentar a coisa até à salvação que um resultado eleitoral menos catastrófico possa constituir, é apenas uma das caricaturas das muitas possíveis a partir do desnorte que reina no cenário confrangedor da política caseira, em nada diferente da que percebemos noutras nações.

Os políticos, à esquerda como à direita, nos governos como nas oposições, andam à nora para descobrirem a pólvora sem fumo de uma solução milagrosa para um problema cada vez mais global que é o descrédito da própria democracia à mercê da multiplicação de fracassos de que a Primavera Árabe é um exemplo flagrante: depõem-se governos ou regimes sem existirem opções concretas de poder, acabando este confiado a quem soa mais credível no meio de tanta mentira, de tanta incompetência, de tanta desilusão.

E entretanto acontece um colapso financeiro que arrasta boa parte da população de países ditos ricos para uma indisfarçável pobreza que o tempo a passar (como o exemplo da Grécia demonstra) ameaça tornar numa miséria como há muito o hemisfério norte não experimenta e com a qual já provou não saber como lidar.

 

Uma no cravo e outra na ferradura acaba por ser o recurso de quem se vê a braços com uma gestão impossível do caos em crescendo que vai eclodindo a partir da revolta abafada por anos confortáveis para a maioria burguesa, a classe média que se vê apanhada pelo turbilhão da falta de soluções enquanto fonte mais à mão de receitas urgentes para tapar os buracos que a corrupção e o desmazelo ao mais alto nível criaram e a crise financeira deixou à vista desarmada dos que mais a sentem na pele.

Identificados na qualidade de responsáveis indirectos (os que não perceberam ou fingiram não perceber) ou directos (os que mergulharam no esterco do compadrio que parasitou fundos colectivos em proveito próprio), aos políticos parece restar o pontapé para canto de uma falsa indignação que não representa nem propõe qualquer solução concreta para o problema grave cujas repercussões ainda agora vão no adro.

 

A crise é também ideológica e dos pensadores que deveriam conceber alternativas aos modelos falhados e cada vez mais desacreditados resultam apenas críticas a uma esquerda radical assente em teorias do século XIX ou pouco mais recentes, a uma esquerda moderada sem soluções para os seus dilemas e paradoxos na complexa adaptação ao capitalismo que entendeu abraçar e uma direita desmembrada e incapaz de entender a complexidade dos desafios colocados pela falência do principal pilar das suas certezas e convicções, a economia de mercado a quem a globalização deu a estocada final por associar um efeito epidémico a qualquer convulsão.

 

No meio desta mixórdia de acusações recíprocas e de avaliação de culpas, assusta perceber que ninguém está próximo sequer de uma efectiva resolução do problema global e nem mesmo a revolução (um conceito algo estapafúrdio no contexto de democracias estáveis) representa um recurso viável por não existirem no horizonte quaisquer alternativas credíveis de liderança.

 

Aquilo que se vê e se sente é a degradação sistemática de todos os bastiões do sistema no qual se depositaram todas as esperanças do nosso mundo ocidental e que, por inerência, se tenta impor sem sucesso onde as ditaduras se revelam mais rebeldes e menos dóceis na aceitação da troca dos seus recursos naturais pelas esmolas de um ocidente em plena decadência. Sistemas judiciais em descrédito, comunicação social em falência, poderio militar ameaçado pela redução inevitável de orçamentos, ideologias incapazes de responderem aos anseios de populações em aflição.

 

E não se vislumbra no horizonte alguém capaz de inverter esta situação. 

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