A posta na hora de ponta
Encurralados pelo trânsito quase parado no engarrafamento das nossas decisões. As adiadas, mais as menos acertadas que nos conduziram ali. Parados no cruzamento, lá à frente o momento de optarmos pelo caminho mais certo a seguir. Semáforo aberto, semáforo fechado, semáforo assim-assim. E atrás o trânsito a abrandar, o destino a buzinar a sua impaciência porque o tempo insiste sempre em passar depressa. Porque nunca há tempo a perder. Preenche-nos o retrovisor, acelerado nas pulsações, hipertenso. E nós ali, quase parados, à espera que se aproxime o momento para passar para um dos outros lados ao dispôr. Pára-arranca. Algum tempo para pensar acerca da hipótese de virar, para depois seguirmos em frente por outro caminho, sempre sob a pressão do que vem logo atrás, consequências, sobretudo pelas omissões.
Também podemos seguir sempre em frente, como faz tanta gente que acreditamos bem sucedida, gente muito determinada e sem mácula de indecisão. Gente que tem sempre a razão do seu lado, como um sidecar. Quase nos dá ganas de buzinar como os outros, de acelerar em vão com o caminho obstruído por tanta decisão acumulada naquele ponto de passagem obrigatória para uma das opções. Sem lugares de estacionamento, proibição absoluta de parar. Excepto quando o semáforo exerce o poder no tom da sua luz. Vermelho é mesmo para cumprir, não há nada para decidir e ficamos ali quietos, à espera de outra cor que melhor nos sirva.
O pé no acelerador, nervoso. O verde que pode aparecer em qualquer altura e nós ainda indecisos quanto ao rumo a tomar. Em frente, pela zona de conforto que nos oferece a habituação. Ou com uma guinada no volante para alterar a direcção e percorrer outro troço do caminho que falta, do caminho que nos resta até ao fim de uma viagem que acaba sabemos onde, mas não quando e ainda menos porquê. Nem queremos saber, apenas nos move a firme intenção de lermos bem o mapa que a experiência de vida nos ensinou a desenhar. Esboços de caminhos, possíveis futuros, desenhos toscos inspirados nos quilómetros já percorridos no calendário que nos recorda a ampulheta que não podemos virar depois de escoado, a qualquer momento, o pouco tempo que ainda sobra até todo o tempo arranjar forma de nos fugir.
Decisões adiadas, decisões menos acertadas, mais aquelas que são para a vida decidir.