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CHARQUINHO

Sedento de aprendizagem, progrido pelos caminhos da vida numa busca incessante de espíritos sábios em corpos docentes. (sharkinho at gmail ponto com)

CHARQUINHO

Sedento de aprendizagem, progrido pelos caminhos da vida numa busca incessante de espíritos sábios em corpos docentes. (sharkinho at gmail ponto com)

04
Jul08

EL PISO DE LOS CINCO EUROS

shark

Chama-se Miguel Marina e é espanhol, mas podia chamar-se Zé dos Anzóis e ser um portuga em tão maus lençóis como aqueles em que o protagonista desta posta se viu embrulhado.

O nome do rapaz nada vos dirá, assim de repente. Contudo, se vos disser que se trata do autor da brilhante ideia de rifar um apartamento para conseguir livrar-se do banco onde o hipotecou já ficam com uma ideia.
 
E por falar em ideia, a do Miguel era brilhante. Digo “era” porque a coisa não teve um final feliz e digo “brilhante” porque se não o fosse não aconteceriam duas coisas: a Imprensa não lhe caía em cima em doses maciças e o Estado espanhol não lhe deixava tão clara a falta de interesse em que a cena pegasse. Ao ponto de a conjugação de esforços entre a Imprensa que o caluniou, sugerindo-o vigarista, e o Estado que o intimidou, impondo-lhe um calvário burocrático que desanima qualquer um mais uma taxa de 15% à cabeça, o levar a acabar com a venda de rifas, desistir do sorteio e devolver o dinheiro (€5) aos milhares de pessoas que aderiram à iniciativa.
 
Porque pego eu no assunto do Miguel?
Talvez seja mais fácil explicar-vos por onde e não porquê.
O Miguel é uma pessoa normal que deixou de ter capacidade para suportar a prestação de uma casa que comprou, algo que pode acontecer a qualquer um de nós.
Tentou então vender a razão do seu pesadelo e descobriu que a crise imobiliária dos states também já fala espanhol, com a melhor oferta a quedar-se €75.000 abaixo do valor em dívida ao banco.
Aflito ainda tentou alugar o apartamento, sito em Madrid, mas deu com intrujas que não pagaram a renda e ainda lhe roubaram parte da mobília.
 
Só quem conhece a aflição de ter um banco à perna (e não só de ouvir falar da coisa) percebe o desespero de causa que levou o Miguel, uma pessoa como qualquer um de nós, a tentar descobrir uma forma de dar a volta ao texto. De resto, os idiotas da Imprensa que decidiram conspurcar-lhe a iniciativa deveriam ter percebido que um vigarista não dá a cara como o Miguel deu: dá à sola para parte incerta e deixa o banco a falar sozinho. Adiante…
 
O protagonista desta posta tem tudo explicadinho no seu site e por isso passo agora a explicar-vos porque pego neste assunto que, em termos mediáticos, já foi chão que deu uvas.
O Miguel Marina, cidadão espanhol, personifica com a sua saga a tragédia da classe média contemporânea. Sonhou alto e aterrou de bruços no pesadelo da moda, como está a acontecer a milhares de europeus.
Honesto, preferiu usar a cabeça e encontrar uma solução digna para o problema em vez de abdicar do sistema que o entalou – bastava sumir para parte incerta como tantos andarilhos que conheço têm optado.
 
E é aqui que o assunto mais me incomoda. Quando toda a atenção do mundo se centrou no drama financeiro do Miguel e na sua engenhosa iniciativa, nomeadamente as empresas que enquanto rondaram as câmaras de televisão lhe prometeram ajuda e depois roeram a corda, qualquer um partiria do princípio de que seriam favas contadas.
Todavia, apesar do ineditismo da ideia, da divulgação worldwide, de um site com quase meio milhão de visitas em poucos meses, de todos os ingredientes necessários para o sucesso (que no caso apenas se tratava de livrar-se do aperto) a coisa falhou.
 
A Imprensa, parte dela, criou-lhe (e à família) um embaraço quando o sugeriu vigarista, chegando a dá-lo como desaparecido com o dinheiro já angariado. E depois entrou na festa o Estado (em causa estão os interesses em matéria de controlo do jogo em Espanha, mais os das imobiliárias que devem ter rezado a todos os santos para a coisa não pegar, mais os de todo o sistema financeiro – sim, a banca - a quem não interessa ver a livre iniciativa empreendedora cair nas mãos do cidadão comum, sem juros, comissões e outras extorsões que nos conduzem a situações como a do Miguel).
A parte da sociedade que não se esteve nas tintas para o homem fez tudo ao seu alcance para lhe travar a passada. E conseguiu.
O resto, alimárias individualistas em que nos deixámos transformar, nem tugiu nem mugiu…
 
 
O Miguel é agora um cidadão com o mesmo problema por resolver mais a carga pejorativa que alguma Imprensa lhe colocou (um indivíduo isolado jamais consegue desmentir com a mesma força este tipo de suspeição) e ainda lhe soma a má vontade que certamente obterá para qualquer ideia arrojada que, tirava-lhe o chapéu, consiga sacar da sua cartola de engenhoso lutador.
O Miguel está flixado à grande e ninguém lhe deitará a mão, como acontece a qualquer um/a de nós quando se cai em desgraça no plano por onde se mede neste mundo canalha o valor dos cidadãos.
 
E eu, sem a sua capacidade de resistência e o seu espírito de iniciativa impar, engulo em seco quando olho o horizonte sombrio das taxas de juro em crescendo, do petróleo em escalada e da crise instalada no quotidiano da maioria.
 
Engulo em seco porque me adivinho potencialmente instalado na pele deste ou de qualquer outro Miguel.
 

À rasca, sem qualquer crédito pelo passado sem mácula e desesperadamente só.

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