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Jun08
MAKE UP
shark
Fazemo-nos fortes porque sabemos que nos pressentem os medos, as debilidades, e não nos poupam a qualquer tipo de pressão.
Fazemo-nos fortes perante a banca necrófaga que nos sobrevoa a existência com borboletas enquanto a sustentamos, voraz, com a fatia maior do sucesso financeiro que sejamos capazes de obter até lhes constar uma falha respiratória ou uma batida irregular no coração que é afinal uma cabeça fria e implacável dos abutres em que se transformam quando as coisas correm menos bem.
Fazemo-nos fortes também perante os vizinhos, os amigos e os familiares a cuja porta não batemos quando a aflição aperta para evitarmos acrescentar-lhe a desilusão costumeira, a confiança que fazemos por merecer mas nunca se ergue por entre os receios quando chega a sua vez de se afirmar. Para evitarmos o embaraço que pode advir do sim como do não e empurrar-nos ainda mais para o chão onde nos sentimos rastejar nessas alturas em que pedimos apenas uma oportunidade para mostrar o que valemos e que para os de fora é de todo irrelevante para a questão.
Fazemo-nos fortes aos inimigos e adversários, agigantamo-nos na directa proporção da crescente aflição que nos cerca a passada com campos de minas que detonamos a cada intervenção desastrada, os flancos à mercê de quem possa extrair da nossa queda alguma forma de prazer.
Evitamos as coisas que fazem doer e já nem o justificamos pela arrogância ou pela estupidez mas apenas pelo instinto de conservação que nos tenta poupar a mais estilhaços numa estrutura emocional feita em farrapos por tudo o que nos consome aos poucos a resistência e a vontade de lutar.
Fugimos em frente quando pintamos a força no olhar ou no discurso e tentamos cobrir as mazelas que nos possam enfraquecer aos olhos dos outros, ameaças potenciais quando o contexto nos aperta num torno imaginário até quase nos sufocar.
Fazemo-nos fortes, disfarçamos.
Até muito tempo depois de qualquer tipo de força se esgotar.