MAIS SEIS TONELADAS DE SERRADURA...
...Para os olhos de quem se deixa impressionar pelos números destas apreensões levadas a cabo pelas nossas diligentes polícias.
Se para a maioria das pessoas, ignorantes acerca das diferenças entre drogas duras e drogas leves, estas operações tão mediáticas podem constituir um sinal inequívoco da eficácia das nossas autoridades, para mim não passam de cosmética para disfarçar a falta de meios e de vontade política para combater o narcotráfico a sério.
O tráfico de haxixe é ilegal e entende-se que as autoridades exerçam o seu efeito disuasor, mas é preciso ter em conta que não existe paralelo entre o pesadelo associado às chamadas drogas duras (cocaína, heroína) e o quanto elas tomam por reféns países inteiros e o que deriva das substâncias derivadas da canabis.
É como comparar uma constipação com um cancro, perdoem-me a imagem...
Sejamos claros: se a ilegalidade é, na prática, a mesma, as consequências sociais, económicas e mesmo políticas dos tráficos em causa são incomparáveis e só não sabe quem não conviveu de perto com os dois lados da questão.
E esse não é o caso dos agentes da autoridade, que saberão tão bem como eu não ser possível medir o real valor da apreensão em quilos mas sim em euros, tal como sabem não ser exactamente o mesmo desmantelar uma rede de traficantes constituida por pescadores, canalizadores, cidadãos comuns, e uma outra onde constam proprietários de Ferraris e de mansões.
É preciso ter em conta as reais dimensões do feito e o quanto a sociedade sai ganhadora do mesmo, para podermos todos assumir com frontalidade se o ganho resultante não sabe a pouco perante a impunidade de quem se movimenta nos mais altos cifrões da economia paralela. E se os portugueses não prefeririam ver o esforço, a concentração e os meios investidos no crime que efectivamente nos lesa em vez de apontarem para a vitória fácil sobre as redes de traficantes amadores.
Estas apreensões "prá balança" e consequentes detenções de arraia miúda no contexto do fenómeno em causa apenas servem os interesses políticos de quem dá a cara pela luta contra o crime.
Pouco ou nada beneficiam os cidadãos que as custeiam com os seus impostos para, na prática, apenas abrirem caminho para a substituição dos zé-ninguéns que traficam drogas que não matam por outros, mais atentos, mais sofisticados, que aproveitam os seus circuitos montados para as drogas que viciam e matam e onde é fácil albergar estes valores residuais que as rotas do haxixe representam.
Por muito que componham as parangonas.