A posta desertora
A tristeza é oportunista. Aguarda em silêncio num esconderijo qualquer, predadora de espaços, e instala-se de armas e bagagens depois de se esgueirar pela fenda que se abriu.
É também muito territorial, essa invasora discreta, e depois de ocupado o terreno fértil do desânimo fortifica as instalações para se defender das poucas armas que restam a quem a queira combater.
A tristeza é perspicaz, pressente a falta de força e corrói a resistência possível como um ácido eficaz. Insidiosa, rasteja como uma serpente nos bastidores da mente e ao primeiro desgosto que encontra crava-lhe os dentes e injecta o seu veneno letal.
A tristeza é também perita na guerrilha emocional, turva as interpretações, destrói relações com os seus actos de sabotagem, terrorista. Consegue transformar os espaços até aos outros em campos minados, uma sementeira de falsos pressupostos que explodem debaixo dos pés de quem ousa avançar.
A tristeza não faz prisioneiros. Executa na hora os inimigos potenciais, as alegrias a mais no seu couto privado. Mata à nascença as ameaças ao seu predomínio, infecta de forma irreversível as melhores emoções enquanto fortalece as restantes, aliadas de circunstância na sua cruzada contra o bom humor e o discernimento que possam contrariar o estado de espírito ideal para acolher a angústia, o desalento. Que possam permitir ao inimigo qualquer espécie de retaliação.
A tristeza não aceita comparação com qualquer outro sentimento, quer inspirar em cada momento um impulso auto-destrutivo, contando para isso com o poder devastador da depressão. E não dispensa reforços como a melancolia, a desconfiança ou mesmo a falta de esperança que alinha sempre com quem adivinha vencedor e a tristeza venenosa é muito astuta.
E o único antídoto é o amor, mas nem sempre resulta.