A posta que vais cair do poleiro
Aos poucos uma pessoa percebe que, na maioria dos casos, as palavras que lhe são dirigidas não passam de mera articulação de sons sem importância ou significado algum. Ou melhor, são proferidas, oralmente ou mesmo por escrito, com a leviandade típica de quem não sabe do que está a falar porque não entende a essência da sua própria mensagem.
Um caso flagrante é o das palavras que envolvem emoções. Mas todas as associadas a valores em desuso sofrem do mesmo padecimento: são parecidas com o som do vento no arvoredo e servem apenas para quebrar o silêncio com coisas giras de ouvir.
As pessoas falam das emoções com a mesma ligeireza com que mencionam tomadas eléctricas. E em ambos os casos são tão ignorantes na matéria que apanham um choque sempre que lhe metem a mão e descobrem a dura realidade dos perigos inerentes a mexer em coisas cujo teor só se conhece de ouvir falar.
Por entre as muitas frases começadas por “eu” sopram palavras sagradas como amor, amizade e outras do género, sem terem consciência do quanto nunca tiveram ou entretanto perderam a capacidade de entender os sentimentos (e os comprometimentos) em causa, excepto quando aplicados pelo próprio a si mesmo.
Fazem sempre má figura, essas pessoas, porque a ignorância ainda é motivo de embaraço e é estupidamente fácil tropeçar numa armadilha lógica quando não temos os pés bem assentes no conhecimento nem que apenas de causa.
O transtorno que essa utilização leviana das palavras provoca é o do respectivo efeito quando são dirigidas a pessoas desatentas o bastante para as levarem a sério. Temos uma tendência inata para a fé que contraria os factos que nos recomendam alguma prudência. E depois sentimos como uma estalada o despertar para a verdade inegável de que as palavras têm sempre forma, mas o conteúdo pode ser equivalente ao da palavra vazio.
É nisto que pessoas e papagaios revelam semelhanças extraordinárias.
Entender um papagaio não exige um esforço por aí além porque temos logo em conta que o pássaro limita-se a repetir algo que ouviu. Já com a pessoa precisamos de primeiro lhe identificar a penugem e só então estendemos o dedo da conversa fiada para que lá possam pousar o bico nas raras ocasiões em que se calam.
Saber lidar com estes bichos, as tais pessoas, requer alguma atenção. Nomeadamente porque corremos o risco de repetirem tudo quanto digamos, mas fora do contexto. É o problema da ignorância que atrás referi, as palavras podem funcionar como granadas e qualquer papagaio desconhece o propósito da cavilha que cuidará de retirar à primeira oportunidade.
Temos que ajustar a profundidade do raciocínio ao desempenho da ave diante de nós e limitarmos-nos a debitar algumas mensagens de encorajamento e a fazer que sim com a cabeça, fingindo acreditar que a pessoa até percebe o que está a dizer/repetir mas sem nunca, mesmo nunca, cair na esparrela de encontrar algum nexo entre as palavras e as emoções ou valores que representem.
Ou seja, de levar a conversa do animal a sério.