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CHARQUINHO

Sedento de aprendizagem, progrido pelos caminhos da vida numa busca incessante de espíritos sábios em corpos docentes. (sharkinho at gmail ponto com)

CHARQUINHO

Sedento de aprendizagem, progrido pelos caminhos da vida numa busca incessante de espíritos sábios em corpos docentes. (sharkinho at gmail ponto com)

24
Set13

O outro lado da picareta

shark

Uma das maiores vulnerabilidades de um desbocado é ter que manter o silêncio quando outros, por exemplo numa posição mais confortável em dado momento, nos matam com o mesmo ferro. Pela emoção, colocamos de imediato o dedo no gatilho verbal e as palavras que são munições até se atropelam na garganta. Mas pela razão vemo-nos obrigados a desculpabilizar o discurso excessivo, a aplicar o mesmo critério que gostaríamos nos fosse aplicado em iguais circunstâncias embora saibamos que assim não é.

 

O desbocado parece merecer todos os castigos possíveis em matéria verbal. Tens a mania que podes falar com o coração? Nesse caso pega lá mais esta pancada nesse sítio onde mais te dói. Ou no orgulho, embora dê menos luta porque, lá está, o desbocado tem sempre uma mania qualquer, um complexo de superioridade ou assim, que o leva a acreditar-se livre para falar demais. E é fácil desequilibrá-lo por aí, com uma rasteira do mesmo veneno, com uma ferroada valente no lombo quando a ocasião se proporciona porque quem fala sem prudência tem (que ter) bom lombo para acolher umas bandarilhas.

 

Por isso o desbocado é alguém menos explosivo do que o esperado pela maioria dos observadores. Ou já disse ou está para dizer (ou fazer) algo de que tenha que se arrepender depois, talvez no momento em que lhe explodem nos tímpanos e no peito as palavras irreflectidas de outra pessoa a quem, por acaso, até já lançou granadas iguais. Ou ainda piores.

Depois acaba por ter que calar, perde sempre a razão por ir longe demais e no fundo até percebe, ou intui, que as outras pessoas também merecem o seu momento sem travões. Ouve e engole em seco enxovalhos ou simples desconsiderações, enfia a viola no saco e sorri amarelo ou baixa a crista em sinal de deserção de parte de si próprio que entende amordaçar para não se ver de novo em maus lençóis de uma cama que faz a toda a hora para nela o deitarem. Como no cliché da sepultura, a do próprio, que se cava quase sem perceber a natureza do trabalho executado.

 

É essa a cruz do desbocado. Nunca mete na cabeça que só ladra alto o cão a quem podem dar nozes porque tem dentes para morder. O outro rafeiro, desmotivado pelas coças do passado ou apenas sem solo firme debaixo das patas para defender qualquer argumento ou posição, refém da conjuntura ou da situação, ladra sempre baixinho.

 

Ou abdica até de rosnar.

16
Set13

Deplorável

shark

A mudança em nós acontece todos os dias, com o envelhecimento e mesmo com as repercussões dos acontecimentos que qualquer existência implica.

No entanto, não damos por isso a curto prazo. Precisamos que passe mais tempo, que exista uma maior distância entre os momentos em que avaliamos os termos de comparação, como uma foto que nos permite comparar a diferença e perceber a marca do tempo a passar.

Com o mundo as coisas também acontecem assim.

As coisas mudam, mais depressa ou mais devagar, e não nos apercebemos da maior parte dessa mudança permanente a que os mais optimistas gostam de chamar evolução, progresso ou qualquer outro termo capaz de exprimir a enganosa sensação de que tudo se transforma num sentido positivo, de que andamos em frente e quase sempre para melhor.

Contudo, de vez em quando paramos para olhar a “foto” de uns tempos atrás, olhamos para as lições que a História nos dá e percebemos o quanto se repetem tantos capítulos desse livro que, cada um/a à sua maneira, com maior ou menor impacto, vamos escrevendo para gerações futuras poderem tirar as suas conclusões acerca dos marcos assinalados num determinado lapso de tempo pelas gentes que os produziram, no sentido de saberem que tipo de pessoas havia quando determinado acontecimento, quando determinada mudança se produziu.

É assim que olhamos para a Idade Média como um período sinistro, da mesma forma que lamentamos a época do Feudalismo ou realidades medonhas como a escravatura ou as guerras devastadoras que invariavelmente afectam a vida das populações em dada altura e constituem, a par com cataclismos naturais, descobertas científicas ou inovações tecnológicas perniciosas, factores de mudança nem sempre para melhor.

E é assim que rotulamos períodos da História mais as pessoas que os fizeram acontecer, da mesma forma que criámos relógios e calendários para nos servirem de pontos artificiais de orientação.

 

Quando tento encaixar o meu tempo sob esta perspectiva e esboço um qualquer cenário futuro para o qual a minha geração esteja a contribuir agora, enquanto o meu país definha à mercê dos abusos e dos desleixos que também eu deixei acontecer e o mundo inteiro parece caminhar sobre as brasas de uma economia titubeante, de uma tensão permanente, de uma hipoteca da maioria dos valores que definem as pessoas e as nações de bem, de um ambiente em profunda e alarmante degradação, de toda uma corda bamba cada vez mais próxima de partir, só consigo antever o pior.

E quando olho para o espelho e percebo as diferenças que o tempo vai pintando na minha carcaça irrelevante, penso nas que se produzem no mundo de que faço parte, na herança que os que partilham este momento específico da existência num espaço comum que construímos (destruímos?) e cada vez mais me preocupo e envergonho com o rasto que iremos deixar.

12
Set13

Espera que passe

shark

À espera.

O ciclo que parece completar-se mas acaba por se fechar sobre si próprio já perto de um fim aparente, de uma conclusão em nada diferente da que nos ofereceu no início que não passava de outro falso ponto final nos seus 360 graus.

A volta completa numa partida feita chegada, uma espécie de eternidade nesse caminho, numa estrada que começa e acaba no mesmo lugar. Uma espécie de rotunda, tão larga que consegue enganar a mais atenta observação e transmite uma falsa sensação de rumar adiante mas apenas conduz ao ponto de partida pintado como uma meta para disfarçar.

A espera.

 

Pelas decisões adiadas, pelas conclusões precipitadas pelo apelo da especulação. Um tapete feito de pontos de interrogação, calcorreado de olhos abertos, às cegas, ladeado de efígies de esperanças feitas em pedra oriunda de uma montanha de desilusões.

Talvez amanhã, no máximo depois. Mas afinal era cedo demais e é preciso aguardar uma nova oportunidade no cais de uma doca ou de uma estação, na paragem do coração que às vezes passa por ali para transportar os sonhos de grandeza para onde a tristeza tratará de os acordar, talvez à partida, talvez à chegada, será uma saída? Dá acesso a uma entrada que não passa de um alçapão.

 

O mergulho de cabeça onde o ciclo recomeça, mais uma e ainda outra vez, percorrido de lés a lés enquanto a ampulheta faz o pino para entreter o tempo a passar mais depressa diante do olhar desorientado daquele viajante sentado num banco, ansiosamente à espera de uma boleia para um lugar distante, para um ciclo diferente, onde a espera não demore tanto tempo a passar.

04
Set13

Levanta-te ou levas

shark

Como consegues olhar a vida nos olhos depois de lhe voltares as costas, depois de optares por um caminho tão diferente daquele que ela nunca escondeu ser o mais acertado?

Percorres essa alternativa em passo acelerado, faz de conta, como se os dias corridos fossem mais fáceis de esgotar, como se assim fosse mais fácil ignorar a traição à vida que desiludes com a cobardia intrínseca de qualquer deserção. Foges, afinal, quando simulas uma azáfama para te abstraíres, mergulhado até ao pescoço nas consequências da apatia que te veste com pele de cordeiro a revolta que entendeste abafar sob o pretexto mais à mão.

 

Invocas perante ti próprio, em vão, as desculpas de mau pagador e tentas fintar até o amor que receias como uma fraqueza potencial. O amor capaz de te fazer mal como um obstáculo onde possas dar um tropeção, a corda esticada para mais um trambolhão que te exponha à dura realidade de seres incapaz de te pores de pé logo a seguir.

Coitado de ti, tão massacrado. Nesse asfalto onde jazes tombado mais o orgulho imbecil que tanto acarinhaste ao longo do tempo em que te acreditaste capaz de viver como sabes que devias.

Agora deves à vida uma explicação, diz-lhe nos olhos qual a razão para essa desistência camuflada sob uma existência indigna da pessoa cheia de vontade que um dia te acreditaste capaz de aguentar até ao fim, tal e qual.

 

Fala comigo, se tens em ti tão firme a convicção de que o teu caminho passa pela solidão enquanto te diriges para lugar algum. Enfrenta a verdade, confronta-a com a tua versão mascarada de uma derrota anunciada no preciso instante em que aceitaste vergar ao peso de uma realidade madrasta, essa capitulação que te arrasta para o fundo sem esbracejares a rebeldia de outrora. Anda, vamos lá para fora e dou-te uma carga de porrada em nome da vida adiada que ultrajas com essa pose decadente e servil.

Afasta os braços do rosto, não te limites a defender esse focinho de cachorro pacato e fiel. Reaprende a seres leal para com contigo mesmo, limpa todo o esterco que te sufoca nessa ira controlada, nessa revolta amestrada, nessa luta interior tão desigual que te transforma aos poucos num perdedor.

 

Talvez aí redescubras o valor da vida que sonhaste para ti e da qual abriste mão.

Olha-a nos olhos e dá-lhe uma boa razão para tanto desperdício, para essa rotina das perdas que já é quase um vício.

E se nenhuma razão te ocorrer, deixa-te de merdas e manda foder esse caminho de cabras, não tens veia de pastor. O teu destino é rosnar sempre mais forte, sempre mais alto que qualquer adversidade.

 

É essa a verdade espelhada, como uma alma, nos olhos da vida que está na tua hora de mudar. 

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