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CHARQUINHO

Sedento de aprendizagem, progrido pelos caminhos da vida numa busca incessante de espíritos sábios em corpos docentes. (sharkinho at gmail ponto com)

CHARQUINHO

Sedento de aprendizagem, progrido pelos caminhos da vida numa busca incessante de espíritos sábios em corpos docentes. (sharkinho at gmail ponto com)

22
Dez08

A POSTA ESPONTÂNEA

shark

É enorme a distância a percorrer entre o que queremos e o que podemos (ou conseguimos) ser.

Claro que algumas e alguns conseguem no mínimo sustentar com maior ou menor razoabilidade a convicção oposta, no fundo conseguimos quase tudo o que quisermos no interior da moleirinha e até podemos ser hábeis a convencer os outros dessas certezas de fidelidade ao protótipo original. Fazem muito bem, pois a paz de espírito é fundamental.

Contudo, tal como a própria liberdade que nos inebria pode não passar de uma bebedeira global em muitos dos aspectos que compõem esse conceito tão lato, o paralelo entre aquilo que nos acreditamos ou esforçamos por acreditar e o que os condicionalismos internos ou externos permitem não é tão óbvio assim.

 

A irreverência é uma das maiores ratoeiras para essa percepção, sendo erradamente conotada com espontaneidade e/ou marca evidente dessa audácia de querermos impor um dado perfil. Mas afinal pode essa (quase sempre) espalhafatosa característica manifestar-se apenas em domínios que a favoreçam, acabando por a pessoa amochar em áreas com piso mais escorregadio e que possam impor preços demasiado altos a pagar pela atitude menos adequada.

De igual forma, a sinceridade absoluta de que algumas e alguns se arvoram como parte integrante do seu carácter acaba por sucumbir à primeira barreira que o bom senso lhe erga. Não, ninguém é absolutamente sincero ao ponto de dizer na cara à vizinha que é impossível olhar-lhe os lábios carnudos sem o sexo oral surgir no imaginário como fogo de artifício instantâneo. Ou de assumir perante o colega de trabalho que na noite sonhada se passaram umas horas de sexo tórrido a dois.

O direito à privacidade basta para justificar a sinceridade amordaçada.

 

De resto, os dados adquiridos acabam sempre por se revelarem um foco potencial de enormes desilusões para os próprios e sobretudo para aqueles que compram o pacote de boas intenções como se de um artigo da Constituição se tratasse. É fácil tombarmos do pedestal das ambições, das expectativas criadas com base nas convicções por testar na prática do emaranhado novelo que acaba por ser a nossa vida.

A tolerância afigura-se indispensável nas relações entre as pessoas e até nas que mantemos com a imagem no espelho, tolerância para com a inevitabilidade da incoerência.

É esse o segredo que distingue os mais felizardos, capazes de relativizarem (quase) tudo à medida da flexibilidade mais ou menos acentuada nos critérios.

 

Isto não implica da minha parte algum beneplácito para com o abastardamento das regras do jogo ou a absoluta ausência de definições de personalidade, pois temos que saber com o que contamos na essência (a nossa e a dos outros) com o mesmo rigor com que definimos os limites a tolerar ou a transpor.

 

Implica apenas a consciência de que não há heróis.

E de que a tal distância que refiro acima só encurta quando somos capazes, por exemplo, de nos rirmos de nós próprios e de reconhecermos com frontalidade os desvios que nos possam deslustrar a mais bem estruturada pala.

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