Vejo nos galhos despidos de folhas a promessa de uma Primavera para acontecer. Vejo aquilo que quiser ver, para lá da imagem que o meu olhar produz à passagem pelo que consegue alcançar a minha visão.
Vejo também com o coração, pois abomino mais do que todas a cegueira emocional. Vejo o bem por detrás do mal que tantas vezes apenas reveste a fachada de uma pessoa magoada e sem força para reagir em condições ao atropelo de emoções descontroladas que a possam assoberbar.
Quero acreditar que o Outono não passa de uma regeneração da natureza queimada pelo Verão, humidade necessária para a refrescar nos pontos mais sensíveis da sua cútis delicada, tão seca como uma árvore desfolhada consegue exprimir.
Acredito que aquele bando de pássaros a fugir não perderá o caminho certo de volta e que não sentirei a sua falta até ao dia em que os possa ver regressar, outro tempo no mesmo lugar, no momento certo em que a cor da esperança cobrir de novo este sinistro arvoredo que dá ares de ter morrido de desgosto pelas chapadas de vento frio.
Mas eu vejo nas águas do rio a mensagem transmitida em qualquer Outono da vida, a certeza inabalável que passado o rigor incontornável do Inverno tudo parece renascer. Mesmo aquilo que parece morrer, como estas árvores desnudas que me despertam a saudade do calor que é minha vontade oferecer a quem consegue de alguma forma vislumbrar em qualquer inverno no meu olhar a concretização primaveril, por detrás, de um verão que assim se anuncia mas pode acontecer em qualquer dia, sobre o gelo derretido pelo calor da explosão do amor ou de uma paixão que pode surgir afinal sem aviso, como um temporal.
Ou como outra partida qualquer das que o clima pode pregar mesmo a quem julga muito bem agasalhada a sua alma recatada que de repente resolve expor-se a nu, em palavras ou mesmo mais, como as árvores nos seus humores outonais, e depois mergulha nos amores, como em cones de vulcões, em busca dos raios de sol.
Vejo com mais confiança aquilo de bom que me rodeia, grato, cheio de esperança, e escuto com atenção tudo aquilo que à minha volta se diz.
Vejo por detrás da realidade que às vezes se pinta madrasta a maternidade de tudo quanto basta para me obrigar a reconhecer-me feliz.