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CHARQUINHO

Sedento de aprendizagem, progrido pelos caminhos da vida numa busca incessante de espíritos sábios em corpos docentes. (sharkinho at gmail ponto com)

CHARQUINHO

Sedento de aprendizagem, progrido pelos caminhos da vida numa busca incessante de espíritos sábios em corpos docentes. (sharkinho at gmail ponto com)

13
Jul08

QUINTA DA FONTE, TEXAS

shark

Regresso do fim-de-semana e encontro as imediações da minha casa a ferro e fogo, com imagens nos noticiários que evocam as do Iraque, da Somália ou de qualquer outra terra em convulsão.

Neste caso foi a Apelação o palco para o tiroteio, mais um, que este concelho de Loures começa a registar com demasiada frequência para não se tratar de uma simples coincidência ou mera rixa pontual.
Não é. É apenas o anúncio do que aí vem, com populações de classe média dos subúrbios a temerem o alastrar destas guerras mal abafadas nos bairros sociais feitos à pressa em nome da Expo 98 e respectivos acessos.
É o princípio de algo que outros pontos da periferia de Lisboa apenas aguardam uma faísca para exibirem também.
 
É constrangedor, depararmo-nos com imagens destas num local tão próximo daquele que escolhemos (ou a vida por nós) para morar. Obriga-nos a repensar tal escolha e a concluir que o Estado começa a perder o controlo das populações encurraladas em boas intenções mal planeadas que depois resultam naquilo que seria de esperar.
É bonito acreditar que as pessoas, marcadas pela miséria dos bairros da lata que os de betão não disfarçam, conseguem dar a volta às suas vidas depois de realojadas em locais que de imediato recebem o estigma inerente à condição dos que lá se despejam claramente com a única intenção de os afastar dos pontos mais sensíveis ao olhar dos eleitores.
Não conseguem e isso não surpreende ninguém.
 
justos e pecadores
 
Claro que é fácil apontar o dedo aos exemplos dos que moram nessas casas pagas pelo erário público e se queixam nas reportagens televisivas que lhes roubaram os plasmas e os dispendiosos sistemas de som. Mas isso é o mesmo que chutar para canto um problema que ou é resolvido ou acabará por degenerar no êxodo das populações vizinhas destes barris de pólvora que a falta de uma presença policial permanente e de um esforço real para distinguir os que precisam dos que se aproveitam e, acima de tudo, de entender a especificidade de determinados grupos e adequar as soluções às suas características. O contrário, a fé de que tudo se resolva por si, resulta nestas explosões de violência que reprimidas ali acabarão por se produzir em qualquer outro lugar.
 
É impossível virar a cara para o outro lado sendo tão óbvia a inépcia do Estado quando lhe compete intervir e a incapacidade das Autarquias de lidarem sozinhas com os seus focos locais de tensão. E não vale a pena fazer a apologia da repressão que apenas adia ou desloca um problema social que diz respeito a cada um de nós, pois cedo ou tarde acaba por nos invadir a vizinhança e porque todos temos uma quota parte de responsabilidade nos desequilíbrios que se geram neste país. Porque não exigimos do Estado uma intervenção realista, linha dura no que interessa (no rigor e no bom senso) quando lhe compete exercer a sua função?
Aceitamos as soluções de compromisso, temporárias, porque nos aliviam do medo de ver instaladas nas nossas ruas as revoltas dos que se sentem, com razão, marginalizados pela falta de opções. Ignoramos o facto de serem muitos os que advogam a expulsão sistemática dos desordeiros e de todos os que partilham a mesma etnia ou cor da pele por tabela, como indesejáveis, para outro sítio qualquer. Para outro país, como se tal fosse possível e mesmo sem ser justo rotular de estrangeiros muitos cidadãos pertencentes a esses grupos mas nascidos e criados sob a mesma bandeira “ariana” que chamamos nossa.
E depois estranhamos as suas reacções, o troco para a leviandade com que misturamos todos no mesmo saco e assim retiramos quaisquer hipóteses aos que tentam de facto a quase impossível integração no “nosso” mundo que deixamos claro não ser o “deles”.
 
casas e perspectivas
 
Ao longo de mais de quarenta anos vi muitas cenas do mesmo género protagonizadas por portugueses tão caucasianos como eu e não gostaria de me ver apontado a dedo por causa de actos que não pratiquei, apenas por partilhar com os desordeiros alguma característica.
 
É isso que está em causa e por isso, apesar de ter o Texas do séc. XIX a instalar-se quase à porta, não advogo de todo a tentação fácil da resolução à bastonada e da indignação pela acção social que só peca por incompleta.

Entristece-me, contudo, perceber que estes flagrantes exemplos de insucesso encorajam os que preferem sacudir as pessoas como moscas incómodas, em vez de exigirem um apoio adequado à sua condição como seria de esperar por parte de gente que se sente superior aos outros mas desmente esse pressuposto com manifestações de uma inferioridade moral que em muito contribui para alimentar o ciclo vicioso da marginalização e a sua tradução literal que é sempre escrita com a palavra violência.

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