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CHARQUINHO

Sedento de aprendizagem, progrido pelos caminhos da vida numa busca incessante de espíritos sábios em corpos docentes. (sharkinho at gmail ponto com)

CHARQUINHO

Sedento de aprendizagem, progrido pelos caminhos da vida numa busca incessante de espíritos sábios em corpos docentes. (sharkinho at gmail ponto com)

02
Mai08

NÃO VEJAS QUE DÓI

shark
Dou comigo a desistir dos noticiários a meio, sempre que a minha filha lhes presta alguma atenção.
E aí concluo rapidamente que ainda não decidi, enquanto pai, se devo enveredar por poupá-la à perda de boa parte da sua inocência (a que se esvai nas inevitáveis contextualizações das faces do mal que se revelam no ecrã como fracturas expostas) ou, em alternativa, se devo embicar pelo tratamento de choque, pelo apoio na criação das necessárias defesas psicológicas para enfrentar o que a espera.
 
Mesmo quem apenas lida com putos deve perceber a natureza do dilema que, de resto, não consigo encarar de ânimo leve. Em causa está uma opção talvez determinante e, no fundo, similar à eterna escolha entre mergulhar os recém-nascidos em água gelada para nunca mais saberem o que é uma gripe ou abafá-los em agasalhos excessivos que os convertem em flores de estufa à mercê das estirpes mutantes dos bicharocos. Parecida também com a que enfrentarei num futuro próximo, quando tiver que escolher entre a postura pai severo que não deixa a miúda sair de casa (leia-se da redoma) e a inevitável ordem de soltura que a lança sem mim num mundo onde acontecem todas as coisas feias que fazem as delícias dos telejornais.
 
Confesso, contudo, que não sei como explicar a uma criança de oito anos que tanto adoro o que leva um psicopata a tornar refém a própria filha para a transformar num objecto sexual alternativo e tão secreto como muitos dos pormenores que rodeiam a parangona do momento.
Igualmente me falha a voz quando me pede explicações acerca da Maddie, da Mariluz e das outras crianças que ouve referir como desaparecidas, violadas, abusadas e mais uma data de expressões a que consegui poupá-la até agora.
Sobretudo desde o dia em que ela só adormeceu perto das duas da manhã, atormentada pela lenta digestão de uma cabeça infantil perante o assassinato ocorrido perto de casa, num local que lhe é bastante familiar.
Esse, não consegui esconder…
 
Para já, tenho oscilado entre o pontapé para canto, não ligues a isso anda brincar com o pai, e a filtragem da informação que lhe chega, adocicando quanto possível a realidade foleira com que ela me confronta e por quanto eu encubra lhe será transmitida à bruta nas palavras ingénuas mas cruéis dos colegas mais avançados no processo ou apenas mais deixados à solta diante do mundo cruel que lhes dá a conhecer a televisão, enquanto os pais se ocupam de outros afazeres.
 
E sinceramente, busco em tudo quanto posso a informação necessária, mais a dose prudente de amor paternal, mais a sensibilidade que a um adulto se exige na educação de um menor, tudo quanto me possa iluminar o caminho até ao ponto de equilíbrio ideal, seja qual for, que melhor a sirva agora e amanhã.
 
Enquanto não o descubro, refugio os meus receios num botão milagroso do comando à distância da janela que cada vez mais torna transparente o tecido imaginário, patético, do mais próximo que consigo chegar ao pudor e ao alívio ilusório de uma cortina.
 
Ou mesmo de um véu.

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