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CHARQUINHO

Sedento de aprendizagem, progrido pelos caminhos da vida numa busca incessante de espíritos sábios em corpos docentes. (sharkinho at gmail ponto com)

CHARQUINHO

Sedento de aprendizagem, progrido pelos caminhos da vida numa busca incessante de espíritos sábios em corpos docentes. (sharkinho at gmail ponto com)

04
Ago06

A LOUCURA DOS QUARENTA

shark

Depois dos quarenta sofri, como julgo que aconteça com os outros machos da espécie, algumas transformações subtis daquelas que se instalam na nossa forma de ser e de estar como softwares marados, insidiosos e piratas, que aterram no disco sem darmos por ela.
Coisas pequenas, quase imperceptíveis no dia-a-dia, mas que influenciam bastante o comportamento de um gajo quando se manifestam de forma automática, involuntária, e assim nos apanham de surpresa.

Com a idade passei a sentir mais na pele as mudanças do clima. Variações bruscas da temperatura que antes eram inofensivas, começaram a fazer-se notar no meu esqueleto e acima de tudo na minha predisposição para determinadas actividades humanas. Como jogar à bola, um pouco mais complicado quando emperram as juntas.
Contudo, o “clima” assumiu igual preponderância. Passei a dar mais atenção às questões de pormenor, mais permeável a essas diferenças térmicas que um diálogo mais quente ou um ambiente propício podem proporcionar.
a noite que me comanda.jpgFoto: Shark
O envelhecimento (ou a maturidade, para quem preferir) desperta-nos para a vida que acontece nos detalhes. Das pessoas também. Um ombro desnudo, um olhar apelativo, uma indumentária especial. E a atitude, o empenho, a frase certa, o gesto adequado.
As pequenas coisas que de repente passam a fazer a diferença na subida ou na descida do mercúrio no nosso termómetro interior. Uma delícia, confesso, um gajo dar consigo a saborear estas cenas que antes passavam despercebidas no meio da gula desenfreada.

Tudo adquire uma nova dimensão, mais sensual. Como se em vez de emborcar a água aos golos pelo gargalo de uma garrafa, sedento, desatento ao diferente sabor que as águas assumem, me desse para absorver o líquido precioso gota a gota. Até ao fim, na mesma, mas empenhado na degustação como se esta constituísse uma forma de sede acessória, alternativa, indispensável, complementar.
A pele mais sensível, mais atenta às sensações. E a cabeça no lugar, confiante, livre dos medos e das vergonhas, dos anseios e das hesitações.

O clima que se cria em torno de uma dada situação. O charme, o calor, a calma necessária para aguardar o momento ideal que se constrói passo a passo, como um lego, sem pressa que torne despercebida uma fresta por onde o frio possa penetrar. A temperatura amena, com tendência a subir. Meteorologia rigorosa, como a que se aplica a um vinho de excelência para o apreciar melhor. A medição com os ouvidos, pelas palavras, com os olhos, pelos gestos e pelas expressões, e em certas circunstâncias, pela reacção epidérmica ao toque suave de uma mão.

outro a nascer.jpgFoto: Shark
A sensacional revelação de que a passagem do tempo não faz esmorecer o entusiasmo (tá bem, a tesão também…), antes o sublima e doseia nas devidas proporções. Quando é preciso (o entusiasmo), está lá. Atento aos tais pormenores, os estímulos insuspeitos, imprevistos, que nos fazem disparar a adrenalina. A graciosidade de um enrolar do cabelo nas pontas dos dedos, o botão desapertado na blusa, a lingerie criada por quem entende como é bonito um corpo de mulher e como um pedaço de tecido se transforma num motor de explosão. A ignição no nosso olhar encantado por miríades de impulsos agradáveis, o milagre da multiplicação da vontade mais um toque de serenidade que nos permite merecer pelo empenho tanta fartura de pequenas emoções.
Os preliminares de si próprios, anunciados aos poucos na subida gradual da atracção.

Aos quarenta, queremos que valha sempre a pena. Que seja sempre muito bom. Exigimos mais e melhor, de nós e das situações que queremos explorar, na cama sobretudo.
Perdemos, falo por mim, a paciência para catraias. As expectativas elevadas têm maior correspondência no comportamento felino de uma mulher madura, exigente, ela própria concentrada em potenciar os momentos especiais.
Trabalho de equipa, parceria, acontece a magia prolongada, a emoção despoletada desde o primeiro instante (quando se recebe o impacto visual de alguém que se preparou por dentro e por fora para nos agradar).

E o mais giro é que também funciona na perfeição quando o termómetro rebenta escaldado e mandamos as medições às urtigas, roupa espalhada pelo chão.
Não morre em nós a capacidade de resposta imediata, se tem que ser agora mesmo a malta pode entreter-se a “preliminar” depois, nem que seja numa agradável e bem disposta, mais atrevida, sessão de palheta. Dá para tudo, esta disposição de quarentão que me tem surpreendido pela positiva e não dá mostras de querer abrandar.

ocasos especiais.jpgFoto: Shark

Sinto-me melhor, em muitos aspectos, do que há vinte anos atrás (sim, no entusiasmo também). Mais consciente de mim e dos outros e das outras que são a alma do que chamo ser feliz. E sou, sempre que (re)encontro a paz comigo próprio e me posso dar ao luxo de ser como sempre me gostei. Sem merdas e sem vontade de conflituar ou de me embaraçar com atitudes menos próprias de mim.
E disso dou conta para que os chavalos que me leiam possam em simultâneo perspectivar o futuro com razões para não o temerem e percebam que vale a pena tentar antecipar alguns dos prazeres que só a idade nos traz.

A pele da vida que se agarra com a mesma sofreguidão, ou maior, porque o tempo anuncia-se mais curto na cabeça grisalha, mas acariciada por prazer com os dedos, com os lábios, com tudo o que temos para oferecer mais uma espécie de gratidão muda pelo que de bom a vida nos dá em troca. No sorriso de um filho que cresceu ou de uma mulher transpirada pelo ardor do amor que recebeu.

O amor que damos, refinado, quando vibramos por dentro mas conseguimos transmitir e absorver o desejo, a paixão e o prazer com o requinte dos entendedores que só a experiência de vida consegue moldar.
Aos vinte era fixe, mas aos quarenta fica tudo melhor. Antes, durante e depois.

Se pudesse recuar no tempo ia lá buscar-me para curtirmos os dois.

vinte e muitos.JPG

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