FUMAR MATAAntes que os/as moralistas do costume avancem com os seus argumentos estafados de antitabagistas primários/as, de ex-fumadores/as convictos/as ou de vítimas passivas do fumo alheio cumpre-me esclarecer que considero o acto de fumar uma estupidez.
Podemos arranjar mil e uma atenuantes e outras tantas justificações: enfiar fumo carregado de agentes cancerígenos pela boca de forma voluntária é uma tolice e ponto final.
Ou seja, não defendo o tabaco como não defendo a minha inocência enquanto vítima da ausência de informação acerca dos malefícios da coisa quando, aos catorze anos de idade, decidi embarcar neste vício medonho. Hoje sei o que me pode esperar, só não paro se não quiser e apoio todas as medidas que tomarem para evitar que mais palermas adiram a esta pequena insanidade.
Agora que estamos esclarecidos quanto à minha posição no assunto, passo a explicar-vos porque insisto em fazer o papel do advogado do diabo nesta matéria.
CONDUZIR MATAPassei as minhas férias numa unidade hoteleira espanhola na qual é proibido fumar em toda a parte menos nos quartos e no exterior. Nos quartos a malta praticamente só dorme, pelo que só na rua (ou quase) é concedido aos fumadores o direito à sua forma mansa de suicídio. Em dias de frio e de chuva, confesso que me sentia um nada estúpido quando partilhava um pequeno espaço coberto no exterior com os restantes viciados enquanto os outros, os puros, nos observavam com expressões de piedade pelos coitadinhos dos asnos.
Não é uma pele fácil de vestir e logo dei início às minhas sistemáticas transgressões de todas as normas que me soam excessivas.
Tal como a coca-cola e o mcdonalds, que dão cabo da saúde aos nossos putos, os americanos foram os pioneiros do disparate antitabagista que agora alastrou à Europa. Não sei o que lhes deu, mas de repente o tabaco tornou-se num alvo prioritário da legislação dos Estados Unidos e agora está a assumir o mesmo cunho na Europa.
Isto a propósito da discussão pública da lei que o Governo prepara para restringir ainda mais os movimentos dos fumadores e que inclui a brilhante ideia de reforçar os maços de tabaco com fotos chocantes de cadáveres e cenas assim.
Não quero que a minha filha siga o meu exemplo, mas não gosto de a saber exposta a imagens de terror que são proibidas no cinema ou na escola mas passam a ser impostas pela lei em qualquer ponto do país. Nos maços de tabaco que nos querem obrigar a esconder.
BEBER MATAIsto deixa-me perplexo, pela morbidez e pelo exagero. Mais ainda do que a ideia peregrina, entretanto abandonada, de transformarem os donos de bares, restaurantes e cafés em polícias do vício, multando-os pelo incumprimento por parte de terceiros, como eu, que não se importam de arriscarem eles próprios a coima em causa. Arriscarei, em mais do que uma ocasião, e aceitarei as respectivas consequências. E se não pretendo enviar baforadas arrogantes de fumo para cima do comensal da mesa do lado ou acender cigarros em espaços fechados na presença de mulheres grávidas ou de crianças pequenas, não contem comigo para, por exemplo, abdicar do meu lugar estratégico junto da janela por onde expelirei o fumo branco da discórdia. Proibido ou não, é assim que farei e assumo a desobediência implícita nesta afirmação.
A hipocrisia preside a esta força que os Estados aplicam invocando a preocupação com a saúde das pessoas, sobretudo as que não fumam. Mas se hostilizam tanto as tabaqueiras e os que as sustentam, porque não se tornam tão rígidos relativamente à indústria automóvel e os seus inseguros caixões metálicos que são responsáveis pela maior fatia da poluição? Eu sou um inalador de fumo de escape passivo e não me vêem reclamar que todas as viaturas automóvel tragam nas portas fotos de cadáveres estropiados em acidentes de viação ou de moribundos com doenças dos pulmões. Ou que proíbam a circulação automóvel fora das auto-estradas
A maior causa de morte em Portugal são as doenças do coração, na sua maioria provocadas pelos venenos que a alimentação inclui. Então porque se preocupam tanto, sei lá, com o tipo de galheteiros que usamos e não cuidam de estampar nas embalagens de sal, em letras garrafais O SAL MATA e vão seguindo esse critério com tudo o que prejudica as pessoas mas continua disponível no mercado para comprar e usar quem quiser?
É que estas leis idiotas visam apenas, como no caso da criminalização do consumo de drogas leves, marginalizar cidadãos. Vergá-los pela vergonha, pelo ostracismo a que são votados pelo seu comportamento ilegal.
TRABALHAR MATAPerdi a vontade de voltar a casa de amigos que torceram o nariz quando no final de uma refeição me encaminharam para a rua, a varanda quando a tinham, para fumar o mais indispensável dos cigarros para qualquer fumador. Mesmo em salas amplas e bem ventiladas, os anfitriões preferiram interromper um diálogo importante ou agradável e banirem da mesa um convidado do que abrir excepções ao seu rigor normativo. Por causa do cheiro, alegam, que se agarra às paredes e incomoda-os (mesmo que tenham passado a infância no convívio com pais fumadores).
E nos carros, a mesma merda. Só te dou boleia se conseguires não fumar. Chantagem pura, que deriva da moral que o Estado pretende agora aplicar com mais acutilância como algo de correcto a fazer. Prefiro andar a pé.
E recuso-me a fazer o papel de doninha fedorenta, tal como sou livre de escolher os espaços onde convivo com alguém e de reclamar legislação que obrigue as tabaqueiras a reduzirem o teor cancerígeno dos seus produtos e as unidades hoteleiras a investirem em sistemas de exaustão de fumos que permitam aos fumadores (que também lhes sustentam os negócios) terem sempre um sector onde não tenham que dar cavaco a ninguém pela sua opção parva.
E se querem mesmo impor a moralidade, vamos então comparar o teor da legislação antitabagista com a que se aplica às unidades industriais (as que poluem e as que fabricam géneros alimentares carregados de E-qualquer número, daqueles que nos mandam na mesma para o IPO mas não são proibidos nos restaurantes, nos supermercados ou seja onde for).
A minha posta já vai longa (O
Lobistico passa-se...), mas o assunto não fica por aqui. A quem quiser contestar-me nesta abordagem inicial, ou apresentar a sua versão das coisas neste polémico domínio, deixo aberta a caixa de comentários para que o possam fazer. Estou receptivo a todo o tipo de argumentação, mesmo a mais absurda, pois sinto que a questão transcende em muito o objectivo apregoado e que o Estado está a ir longe demais na interferência nos direitos e na imagem dos seus cidadãos, optando pela parte mais fraca (o indivíduo e a sua impotência para se defender) para impor aquilo que seria mais complicado mas legítimo perante o verdadeiro poder (a corporação e o dinheiro a ela associado).
Discussão pública, querem eles. Está iniciada a minha intervenção.
E AQUILO? TAMBÉM PODE MATAR...