Um dos fenómenos que mais me intimidam de entre as aberrações directa ou indirectamente ligadas ao amor é a obsessão. Venha de onde vier.
A evolução de um afecto obsessivo raramente não degenera em comportamentos bizarros, agressivos até. Como se a fixação de alguém noutra pessoa representasse a paixão na sua forma mais negra, o lado obscuro do apego em demasia.
Um dos primeiros obstáculos naturais com que o obcecado de qualquer género se depara é a normal desproporção entre o seu alegado amor e respectivas manifestações e o grau de estima da pessoa seleccionada. Muitas vezes, essa variante perigosa e tão facilmente confundível com algo de bom exacerba o instinto de posse absurdo e o ciúme ilegítimo, conduzindo a desfechos imprevisíveis e dignos de episódios de loucura temporária.
As obsessões entranham-se em quem as vive como cancros cujas metástases parecem concentrar-se no cérebro, em pleno centro nevrálgico das emoções. Alguns chegam a delirar, inventando falsos passados e promessas de futuro que não passam de contratos virtuais estabelecidos com a própria imaginação à luz de uma expectativa qualquer. Recriam falsas memórias, sublimam sensações nunca experimentadas, cultivam uma realidade paralela em torno de um holograma (normalmente obtido a partir de escassos momentos de contacto pessoal, ou até com base em fotografias do seu alvo de eleição).
Inofensivos, alguns, também os existem particularmente ameaçadores. Por norma, os que entendem a "amada" ou o "amado" como algo de seu. Encaram tudo quanto mexe como uma ameaça a esse poder e reagem de forma hostil. Sem limites nas consequências quando algo lhes mata a esperança que não se permitem perder.
Contudo, não seriam necessários esses casos (felizmente) excepcionais para se concluir que nenhuma forma de obsessão é positiva quando aplicada ao amor. Trata-se de uma combinação contra natura, um erro de casting emocional.
Os obsessivos, e falo delas como deles, constituem para mim um perigo latente e sempre que o instinto ou outra forma de percepção me alertam para tal hipótese coloco-me de imediato em modo sentinela. E não me deixo levar por condutas ou perfis aparentemente serenos, pois não existe um meio de avaliar o impacto de uma fixação obsessiva nas reacções descontroladas de quem a nutre por alguém.
No que concerne ao amor e à paixão, só o saudável é aceitável e normal. Tudo o resto constitui uma tremenda incógnita e a história regista os inúmeros exemplos dramáticos para quem não levou a sério determinados sinais.
O obsessivo inteligente raramente se deixa trair pelo excesso visível, controla as emoções e age sob uma camuflagem bem preparada. É um falso amigo ou um vizinho dos que inspiram confiança, difícil de detectar nas suas deambulações esquizofrénicas pelo conto de fadas que a sua cabeça lhe transmitiu.
Até ao dia em que não resiste ao impulso ou os factos lhe fazem desabar o castelo de areia, despoletando uma surpresa desagradável aos visados que tenham o azar de se verem figurantes ou protagonistas da sua fantasia tão real.
Detesto saber-me desprevenido e já me assumi desconfiado, ou mesmo um tudo nada paranóico, pela obsessão (ah pois, todos temos uma
) com a minha segurança e a dos que me são próximos. Poucas vezes me distraio, empenhado que estou em evitar dissabores por essa porta aberta ao desconhecido.
Mas nesta matéria em particular nunca me presto a desatenções.