09
Mar06
NO CESTO DA GÁVEA
shark

O vigia quase adormecia na noite de lua cheia em que o mar se fez espelho e reflectiu as estrelas na calma da sua maré.
Sozinho no alto, sonhava voar como as gaivotas que lhe faziam companhia nas horas de vigília e nos sonhos interrompidos em sobressaltos sem justificação. Falsos alarmes que lhe interrompiam o doce ressonar primaveril.
Depois embarcava outra vez no mundo das fantasias e das ilusões.
Nessa noite de sentinela o vigia não dormiu. Ou era essa a sua impressão, quando no meio do oceano vislumbrou o que lhe parecia um manto de sereias no ouro das areias de uma ilha que o mapa não referiu.
Uma surpresa que o emudecia, incapaz de gritar a terra à vista no olhar que o traiu.
Deixou avançar a embarcação, encantado, ébrio pela beleza que o grupo de sereias lhe cantou.
Descurou a vigilância e o destino não perdoou. Na popa desguarnecida do barco desgovernado o perigo espreitava e o homem de guarda não alertou a tripulação.
Sem um tiro de canhão, o galeão dos piratas deu início à abordagem e o final da viagem depressa se adivinhou.
Só então o vigia acordou.
No topo do mastro as lágrimas escorriam pelo rosto abaixo no homem que a noite embalara num sono letal.
Em desespero lançou-se ao vazio num mergulho temerário e aterrou no corsário que comandava o galeão.
Reza a lenda que os piratas desertaram e no seu barco zarparam para longe dali.
E ao vigia, que entretanto desapareceu borda fora no meio da confusão, honraram a memória com uma estranha canção.
Falava de uma ilha perdida que alguém sugeriu na versão inventada do herói que sumiu.
E na ilha deserta que ninguém mais veria, sereias mimavam por turnos o vigia que ali abancou.
