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CHARQUINHO

Sedento de aprendizagem, progrido pelos caminhos da vida numa busca incessante de espíritos sábios em corpos docentes. (sharkinho at gmail ponto com)

CHARQUINHO

Sedento de aprendizagem, progrido pelos caminhos da vida numa busca incessante de espíritos sábios em corpos docentes. (sharkinho at gmail ponto com)

15
Jan06

DEIXE MENSAGEM APÓS O SINAL

shark
sinal algum.JPG
Porque será que só acreditamos na nossa existência quando os outros a testemunham?
Parecemos dependentes de uma confirmação exterior que nos garanta a autenticidade, como se não acreditássemos em nós sem a fé das outras pessoas a corroborar.
Como se a nossa presença na vida fosse feita apenas daquilo que somos capazes de produzir em matéria de interacção. Interferimos nas vidas alheias para sentirmos a essência da nossa, encaramos com hostilidade ou temor os fenómenos de rejeição.

Generalização, claro, o pressuposto da muleta lá de fora, o contacto periódico que nos consolida a participação na vida em termos satisfatórios.
Enlouquecemos de solidão, cativo na masmorra do silêncio o animal social dentro de nós. Comunicação sem retorno, monólogo enfadonho de quem não suporta a ausência de um sinal.
Podemos fingir que não precisamos, sempre que nos damos ao luxo de esbanjar. Arrogância de quem caminha para o lado infeliz da questão, o caminho da prescrição na validade da nossa condição natural. Uma diferença abismal entre o discurso sobranceiro e a humildade de quem já se conformou com a emergência da verificação.

De nós próprios, entregues aos outros na dependência desse eco do nosso desempenho. Frustrante a ausência, humilhante a anuência ao tratamento de segunda que os outros disponibilizam. Como males menores que se toleram por falta de alternativas, como os hábitos rotineiros que não conseguimos dispensar. Egoísmo, afinal, quando a nossa manifestação de carência se converte numa imposição da presença na vida de quem nos quer afastar.

Patéticos, pindéricos, cachorros abandonados à mercê da caridade de alguém. Fazemos tudo para chamar a atenção, como miúdos mimados. Palhaçadas sem nexo que reduzem qualquer ego a pó, quando a falta de reacção do receptor traduz o vazio que a mensagem enviou de volta. Endereço insuficiente ou destinatário ausente na morada do sonho que o tempo esborratou.
Aos poucos, tomamos consciência da falta de paciência geral. Egocêntricos, os círculos concêntricos planam no ar como bolhas de sabão que explodem como pequenas bombas em contacto com o chão.
Onde aterram as mais sólidas ilusões, mesmo quando por milagre se fundem destinos e se percorrem os caminhos paralelos que se separam na primeira intersecção.

Claro que tudo isto se nega com meia dúzia de sinais contraditórios, que rimam com supositórios que nos aliviam as dores no cu depois da biqueirada final. A vida continua, fervilhando no meio da rua onde circulam os alvos seguintes para o acto de contrição.
A esperança que é a última a morrer, coitada, depois de espezinhada sem dó pelos desmazelos, pelos atropelos e quantas vezes pelos contornos dissimulados do que se revelam verdadeiras traições à posteriori.

Mas nem assim desistimos desse fardo, insistimos na abertura das vias de comunicação. Canal aberto para a desilusão das expectativas criadas em torno de um ideal mais absurdo do que uma utopia.

As fantasias sonhadas são gentes cansadas e sem força para a emoção.
15
Jan06

POR ACASO

shark
por fim.JPGFoto: sharkinho
Naquela altura pedia a todos os santinhos que não lhe perguntassem de que terra era, pois não saberia como responder a essa questão.
Sentia-se um apátrida no interior confuso da sua mente etilizada.
Tentava concentrar-se na luz distante do farol do Bugio quando a presença dela se fez sentir, ao seu lado, na areia diante da fogueira que espantava o frio da madrugada que o mar acrescentava com a humidade costeira habitual.

Era uma mulher determinada, como se lia sem dificuldade no brilho e na profundidade do seu olhar. Bonita também.
Dera com ele isolado em frente da fogueira a olhar para o farol e estranhara a sua expressão. Aproximou-se para indagar, curiosa pelo alheamento dele ao grupo que o rodeava e pela tristeza que lia na atitude e no rosto agradável mas perturbado daquele homem.

Perguntou-lhe se estava bem e ele respondeu-lhe com um olhar de menino que a encantou.
Instintos maternais. Justificou assim perante si própria a carícia nos cabelos que lhe ofereceu, quando ele não lhe respondeu senão com um suspiro profundo de quem suporta todos os males do mundo.

Alguns segundos de silêncio, ao som das ondas e do crepitar da fogueira, e ele reagiu. Sorriu e aproximou uma mão do rosto daquela mulher interessante que tentava confortá-lo de alguma forma, uma bênção do céu. Que mostrara preocupação, ao contrário do grupo que desertara e assim o abandonara no tormento da bebedeira deprimida a sós.
Uma crueldade, naquelas circunstâncias. E por isso nada fez para evitar aquela mão que se aproximava devagar do seu rosto e a acarinhou. A pele arrepiou, quando os dedos suaves percorreram a raiz dos cabelos, da testa ao queixo que beliscou de forma meiga no fim.

Depois deixou-se abraçar, quando ele a encostou a seu lado e lhe contou as histórias que trazia dentro de si. Sentia no corpo o mesmo calor que as palavras daquele homem transmitiam quando falava emoções. Gostava do tom, gostava do som, parecia conhecer desde sempre o estranho que a aconchegava contra si.

O beijo surgiu do nada, no meio de uma frase inacabada que uma gaivota interrompeu.
Nascia o sol por detrás da ponte quando os dois amantes se deitaram na areia e celebraram com devoção o romper de um novo dia.

Depois ele partiria, anónimo, de volta para o seu destino traçado que um momento encantado não poderia alterar.

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