Das escolhas que distinguem jornalistas de jornaleiros
Cada jornalista (e falo de profissionais a sério, dignos desse nome) deverá possuir um conjunto de atributos que no fundo lhe desenham o talento como somos capazes de o reconhecer.
Esse equipamento de série, características pessoais específicas, associa-se à tarimba adquirida ao longo de uma carreira sempre construída (recordo que falo de jornalistas e não de pessoas com carteiras profissionais da farinha amparo) a pulso, a custo, sob um lote incomensurável de pressões que as pessoas normais não têm arcaboiço para aguentar no exercício de uma função.
Logo à partida, aos jornalistas é exigido um compromisso com a verdade num mundo cada vez mais dominado por mentirosos.
E por pavões.
Com a verdade como missão, existem duas maneiras de a revelar: pela boca do próprio jornalista ou pela dos protagonistas de determinada história ou realidade. É uma arte, saber pôr as pessoas a falar. Quando essas pessoas são figuras públicas e têm um estatuto a defender, a figura do jornalista é a de um papão capaz de construir ou destruir carreiras. Jogar à defesa, refugiando-se no vácuo do superficial, é quase instintivo para a maioria e é assim que acabamos por levar com jornalismo morno, com entrevistas inócuas, com peças cinzentas num tabuleiro no qual se confrontam experiências, inteligências, em torno de jogadas que são os factos que precisamos conhecer mas que se perdem nos receios de uns e na sede de projecção de outros.
No vazio.
Um jornalista, quando lhe são colocados os meios ao alcance para abordar um tema (e os assuntos são igualmente importantes, se não na relevância – sempre discutível – pelo menos na seriedade da respectiva abordagem), tem que saber definir a prioridade. E essa passa, por exemplo, pelo formato escolhido pelo profissional para cumprir a sua verdadeira missão: informar.
Por formato entenda-se um conjunto abrangente de opções que determinam o resultado final (por se revelarem os mais adequados ao cumprimento do objectivo em causa) e que passam até pela invisibilidade do próprio arquitecto da coisa. O Jornalista (a maiúscula não é um lapso) é uma pessoa a quem uma decisão tão difícil para a maioria de nós como abdicar da notoriedade em prol da melhor construção possível para uma peça surge como algo de tão espontâneo como a curiosidade que a todos nesse ofício deve impregnar.
É uma escolha consciente, assente no brio e na vontade de fazer sempre o melhor. Livres de constrangimentos de índole subjectiva, os Jornalistas, the few, concentram-se no espírito de missão e abraçam a versão que sirva de bandeja a informação, o esclarecimento, a verdade nua e crua da realidade que lhes compete dissecar.
Um exemplo de tudo quanto disse acima pode encontrar-se com facilidade, bastando atenção ao pormenor, num trabalho da Joana Latino acerca do mundo das telenovelas que a SIC está a passar ao longo da semana no seu Jornal da Noite e que recomendo, no contexto desta posta, sem hesitar.