SAUDADES DO TINO DE RANS
A anunciada candidatura do mais bizarro híbrido do jet set português à presidência de uma Câmara Municipal pode inspirar-nos sorrisos, pelo absurdo, como pode sugerir-nos insultos, pelo descaramento. Mas pode e deve alertar-nos para o facto de esta iniciativa do bobo da corte poder constituir o primeiro passo para que, por exemplo, os participantes na casa dos segredos comecem a tomar conta das Juntas de Freguesia das suas terras, de assistirmos à propagação de um fenómeno que já se faz sentir em diversas áreas da vida pública e que se traduz na projecção mediática como principal critério de selecção seja para o que for.
O Tiririca, como se previa, já está a fazer escola neste país cheio de sentido de humor e vazio de alternativas. De resto, o enérgico Coelho madeirense já tinha apanhado essa onda e agora lá anda, mais a família e amigos, a dar cabo da cabeça ao Alberto João. O passo seguinte, na lógica simples dos famosos que precisam mesmo de dar o litro para atraírem os holofotes, é esta candidatura sonsa de um espertalhão que vai a todas (e a todos?) para rentabilizar o protagonismo, seja ele qual for.
É esse precedente que me preocupa, neste contexto de desorientação eleitoral tão permeável a figurões e figurinhas, e me leva a dar razão aos que pugnam em defesa da classe política.
De facto, o exemplo que me move é uma exibição grotesca de um dos cenários possíveis para o eventual castigo que os eleitores pretendam aplicar ao todo barrado com a manteiga da generalização. Substituir os políticos por figuras decorativas sem qualquer espécie de noção da responsabilidade que um cargo político acarreta, e as broncas não acontecem a brincar nem se resolvem com meia dúzia de larachas, é nada mais nada menos do que uma leviandade descomunal.
É certo que sobejam exemplos de palhaçadas governativas e de folclore autárquico, mas uma Democracia digna desse nome leva-se a sério. Se temos que exigir mais e melhor dos nossos políticos, existem mecanismos ao alcance para isso acontecer.
Se entregamos o poder às figuras mediáticas ou aos palradores populistas, em vez de o devolvermos às pessoas capazes e de bem que possam promover a recuperação do país podemos assistir num futuro próximo a um pandemónio que só agravará ainda mais a crise em que mergulhámos.
E abrimos os portões para a entrada de figuras bem menos simpáticas, tiranos oportunistas, que brotam como cogumelos ao mínimo indício do que, na prática e tendo em conta personagens como o tal candidato anti-lojas do chinês, constituem nada divertidos e sempre muito perigosos vazios de poder.