A POSTA IMPOSTA
A Polícia chegou sem alarido, deu uma vista de olhos na mercadoria e de imediato a arrecadou no porta-bagagens do carro patrulha. E a vendedora ambulante, sem qualquer tipo de licença para a venda de rua naquele local, lá entrou para o carro, resignada com o transtorno e com a eficácia dos agentes de autoridade que nem deram tempo para se formar o ajuntamento de padroeiras da coitadinha que está a tentar ganhar a vida e antes isso do que roubar.
Mas eu, malvado sem coração, considero que a economia paralela constitui ela própria um roubo descarado a cada um de nós, contribuintes, e um insulto aos lojistas do ramo que pagam balúrdios de renda nessa mesma rua e ainda têm que suportar os custos fixos que um estabelecimento acarreta. Para além, claro está, de contribuírem para os (nossos) cofres do Estado com a percentagem estipulada do IRC.
E por isso aplaudi em silêncio a actuação da PSP e só lamento que não exista vontade política e meios ao alcance das autoridades para intervirem com ainda maior eficácia em todos os casos nos quais seja óbvio um esquema marginal de obtenção de rendimentos daqueles que adulteram as contas de todo um país e talvez expliquem os contornos bizarros desta crise que parece afectar a todos mas depois, onde o dinheiro se gasta, parece não afectar a ninguém.
Claro que um dos argumentos da praxe nestas coisas, logo após o da piedade popularucha que vai fomentando estes fenómenos de enriquecimento pela porta do cavalo (estamos a falar de comércio e de lucro financeiro puro e simples), é o de que os maus exemplos vêm de cima e os pequeninos não têm que ser vítimas dessa condição minorca em detrimento dos colossos que conseguem fazer escapar rendimentos tributáveis por tudo quanto é buraco no chão ou na Lei.
E é esse que mais me incomoda, pois raramente me permito unir forças com o lado mais forte de qualquer questão. Na verdade acabo por me sentir mais roubado pelas grandes empresas que não cumprem as suas obrigações fiscais do que pelo vendedor de roupa à socapa.
Contudo, e bem vistas coisas, também nutro menor antipatia por um simples carteirista do que por um gangue capaz de assaltar a caixa de esmolas da igreja local mas isso não invalida que na hora da verdade, mais ou menos gamanço, é fácil concluir que só muda o tamanho.
O crime, na essência, é exactamente o mesmo.