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CHARQUINHO

Sedento de aprendizagem, progrido pelos caminhos da vida numa busca incessante de espíritos sábios em corpos docentes. (sharkinho at gmail ponto com)

CHARQUINHO

Sedento de aprendizagem, progrido pelos caminhos da vida numa busca incessante de espíritos sábios em corpos docentes. (sharkinho at gmail ponto com)

17
Mar06

ISTO DE TER UM BLOGUE

shark
dimensão paralela.jpg
aqui


Mesmo depois de mais de dois anos neste meio (ou talvez por isso mesmo), esta coisa de ter um blogue ainda não deixou de me fazer reflectir.
E quanto mais longe me encontro dos tempos da descoberta, em que tudo o que os outros escreviam me parecia absolutamente extraordinário, mais estranheza me causa esta nossa necessidade, quase compulsão até, de aqui desenvolver uma vida paralela.
Não se pense que venho armar-me em socióloga de pacotilha, analisar científicamente o que são e para que servem blogues ou produzir uma dissertação sobre este fenómeno em expansão. Tudo isso já foi feito em encontros sobre blogues, tertúlias sobre blogues, postas sobre blogues. Não tenho qualificações ou sequer pretensões a dizer aqui seja o que fôr com essa classificação.
E estou-me nas tintas para a hipótese de quem tiver a pachorra de ler o que escrevo poder achar irrelevante o tema, precisamente pelo facto de estar mais que batido. A mim continua a intrigar-me esta nossa motivação para aqui chegar e despejar os nossos pensamentos mais íntimos, perante uma plateia de olhos desconhecidos. Uma espécie de monólogo sob o holofote, um gajo a desenvolver um guião, ao longo de meses e anos, uma voz solitária a ecoar sobre o escuro da sala. A sala em suspenso, apenas se percebe um subtil rumor de respirações, algumas vezes quase presas, para não interferir na linha de raciocínio de quem actua.
Depois as palmas. Apenas em alguns casos, aqueles que permitem a interacção e abrem a hipótese de comentar. Nem sempre as palmas, a bem dizer. Mas uma reacção do público, seja ela qual fôr. E novamente o guião.

O que nos leva, pessoas das mais diferentes naturezas e campos profissionais, médicos, juristas, jornalistas, políticos, professores, donas-de-casa, a chegar aqui, depois de mais uma operação cirúrgica, um caso ganho na barra do tribunal, uma reportagem exclusiva, um discurso aclamado, uma aula muito participada pelos alunos ou a louça lavada e camas feitas, a vir aqui despir essas peles para entrar na massa indiferenciada de gente que pinta o seu template das cores que mais gosta, configura títulos e sidebars, escolhe fotografias e imagens a condizer com os textos e planta palavras como quem o faz com uma árvore que quer ver crescer?
Que mecanismos mentais estão por detrás desta existência que aqui levamos, dissociada das vidas que temos lá fora? Tantas vezes completamente antagónica. E doutras quase como que um espelho de quem somos na verdade.

Transpomos a porta que se abre para outra dimensão e passamos a tratar por tu o médico que escreveu sobre o novo PR, a doméstica que produziu um texto sobre a fome no mundo, o professor universitário que esgalhou um poema sobre qualquer coisa, desatamos a criar laços (imaginários, quantas vezes) com pessoas que estão na outra ponta do país ou do mundo e que nunca vimos e difícilmente chegaremos a ver, na generalidade dos casos.
E assim substituimos as antigas idas domingueiras à praça, as conversas de fim de dia no largo, as ansiosas correrias para ver os tecidos que nos traziam outras gentes, de outras paragens. E assim começamos a substituir idas ao cinema e ao teatro, conversas de café, encontros com amigos e conhecidos de conhecidos e amigos. Há dias (mais ou menos, muitos ou poucos, conforme os casos) em que fugimos de tudo isso para construir tudo isso de novo, por aqui, do lado de cá de um monitor.
Ouvi, numa conferência, alguém credenciado afirmar que, ter um blogue ou ser frequentador da internet em geral, é uma estranha tentativa de evitar a solidão, feita por pessoas que querem evitar a intimidade. Um contrasenso, afinal.
Ou então é apenas, de acordo com Sherry Turkle, a forma que encontramos de poder aqui "brincar" aos heróis imaginários, em que somos nós o que carrega a capa nas costas...Uns criam aqui as máscaras do personagem que gostariam de ser aos olhos dos outros e, sobretudo, aos seus próprios. (tão convincentes se tornam que, às vezes, até eles próprios passam a acreditar nessa identidade e a esquecer quem na verdade são). Outros aproveitam para chegar aqui ao fim do dia e deixar cair as que usam lá fora. Raros, são aqueles em que o personagem é um decalque da pessoa de carne e osso que o compõe.

Dois anos neste processo leva a alguma evolução na forma como se vê este mundo.
Antes, entretinha-me a imaginar que tipo de pessoa estaria por detrás de textos muito bem escritos. Agora, dou por mim a olhar para as pessoas reais e a imaginar que nick esconderão por detrás das aparências normais com que se cruzam comigo na rua.

Mar

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