BALÃO DE SORO
Sentiu partirem-se aos poucos todos os elos de ligação do cesto ao balão insuflado de ilusões que lhe permitiam sobrevoar a realidade como numa bolha de sabão à espera de rebentar.
Nem chegou a tentar livrar-se do lastro, sacos cheios de memórias carcomidas, pedaços de tempo de vidas que agora o arrastariam mais depressa para o chão quando se partisse a última ligação a tudo aquilo que o prendia ao céu.
Em pânico, era ainda pior a iniciativa do que a resignação. De cada vez que tentava intervir criava maior aflição e sentia menos firme o pouso dos pés, logo acima de rochas pontiagudas que aguardavam a queda para o trespassarem sem dó.
Sentia-se cada vez mais só na difícil missão de encontrar uma salvação miraculosa, uma saída airosa para o colapso da fantasia que alimentava enquanto dormia e sonhava com um mundo cor de rosa onde tudo podia acontecer.
As coisas que queria fazer, a bordo do balão onde começara a viagem e se deslumbrava com cada paisagem ao seu alcance no ponto tão alto a que subiu...
Afinal era um balão que caiu antes mesmo de deixar o chão, arrastado pelo vento numa corrente de ar do pensamento positivo de um sonhador, um crente fervoroso na capacidade de o amor ultrapassar qualquer tormenta, de sustentar uma utopia que se acalenta na bebedeira das emoções.
Mas só lhe restavam balões de soro, esperanças teimosas, reprimido o choro pelas tentativas raivosas com que se esforçava, em vão, por atar de novo cada ligação quebrada para evitar a sua queda mais a de tudo quanto trazia a bordo do cesto que agora sentia desamparado do balão que sabia perdido nas nuvens que o privavam do sol e da sua luz.
À deriva na escuridão que qualquer desilusão produz.