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CHARQUINHO

Sedento de aprendizagem, progrido pelos caminhos da vida numa busca incessante de espíritos sábios em corpos docentes. (sharkinho at gmail ponto com)

CHARQUINHO

Sedento de aprendizagem, progrido pelos caminhos da vida numa busca incessante de espíritos sábios em corpos docentes. (sharkinho at gmail ponto com)

30
Nov08

VERDADES INCÓMODAS

shark

Já aqui falei nessa aversão que me provoca constatar que alguém apagou um blogue.

E eu já o fiz, pelo que não me ponho em bicos dos pés quando manifesto essa repulsa por um gesto que, aprendi na altura, constitui um gesto de desprezo para todos quantos participaram na construção desse espaço.

Queira-se ou não, um blogue conserva pedaços de vida. De quem o fez, acima de tudo, mas também de toda a gente que o leu, que o lincou ou o comentou. Trata-se de um registo de pessoas, de eventos, de emoções que basta deixar ficar no sítio para não desaparecerem de vez.
 
Quando alguém apaga um blogue só me ocorre a ideia de que pretende apagar também os rastos de uma porção de vida que pretende escamotear, para a esconder a alguém ou para evitar fazer a má figura como a sente quem se embaraça com passados que renegou.
É um acto de desprezo mas é um acto de cobardia também.
E denuncia na condição quem o pratica.
Mais uma vez, recordo que eu próprio já o fiz num acesso de fúria. De pouco me vale o arrependimento agora, mas bastou para que entendesse que se nos queremos dar ao respeito no que aqui fazemos não podemos depois cuspir nos olhares de quem assim se apaga naquilo que ajudou a construir e a fazer o sentido que assim se esgota com a magia do apagador.
 
O problema é que as memórias dos outros não se podem apagar.
E é sempre fácil de lembrar os detalhes que denunciavam, na altura em que esses blogues existiam, a essência de quem mais cedo ou mais tarde acabaria por os eliminar.
29
Nov08

NÃO FINJAM QUE ACREDITAM

shark

É uma chatice, mas é a sinceridade o ponto de partida para todas as verdades incómodas. Seja por um acesso de fúria ou sob a forma de revelação num momento propício, quando alguém se permite ser sincero é garantido que algumas das verdades abafadas ou reprimidas soarão como bujardas na pele de outrem.

A sinceridade é assim como o sexo, no que respeita à sua imagem pública. Todos sabemos que é bom mas na maioria dos casos praticamo-lo às escondidas e até temos vergonha de o falar.
E até se torna feia na perspectiva de quem a recebe no peito quando preferiria escondida a realidade que alguém entendeu verbalizar.
 
É paradoxal a relação entre a defesa intransigente de uma atitude aberta e frontal e a rejeição visível dos efeitos práticos da respectiva adopção. Ou seja, o inferno está cheio de boas intenções hipócritas. Daquelas que nos fazem não saber para que lado pender quando nos confrontamos com tais escolhas.
Se é certo que em teoria o consenso roça a unanimidade e mesmo as pessoas mais falsas fazem a apologia da sinceridade enquanto correcta e até indispensável, na prática das relações humanas tende-se a varrer para debaixo do tapete tudo quanto possa ser substituído por uma conveniente omissão ou, ainda mais incongruente, por uma mentira piedosa.
 
O poder de encaixe exigido pela sinceridade absoluta equivale à nudez psicológica total e permanente no relacionamento com outras pessoas. E essa, se nem mesmo perante os mais próximos a esmagadora maioria de nós consegue lograr, quando aplicada aos de fora é receita infalível para o exílio social.
Mesmo os que possuam as características, as condições ideais e a motivação necessárias para dizerem sempre o que lhes vai na alma dificilmente terão arcaboiço para enfrentar as reacções alheias que, salvo raras excepções, tenderão sempre para uma forma de hostilidade (o sincero, como o nudista, é no mínimo um excêntrico aos olhos da maioria) e, em última análise, acabam por se ver isolados como bactérias infecciosas pelo perigo que representam.
 
É perigoso ser frontal numa sociedade com predominância hipócrita. Ser sincero é uma desvantagem lógica no confronto com aldrabões ou mesmo com gente de bem mas cobarde demais para assumir aquilo que sinta como fraquezas.
Quem opte pelo caminho da verdade que até a nossa religião predominante preconiza condena-se a receber o troco por parte de quem se habituou a gerir a vida e a personalidade como plasticina.
À pessoa frontal chamamos desbocada, atrevida, insensata, inconveniente ou mesmo desagradável.
Até o Estado cultiva e sobrevaloriza aquilo a que chama de seu segredo, o saco azul para as omissões que dizem servir melhor os nossos interesses para não terem que nos chamar burros com as letras todas. Porque papamos o grupo e não exigimos a verdade e a transparência, tal como o fazemos com tudo e com todos no dia-a-dia.
 
São estes os pequenos quês que envenenam a saúde das relações entre as pessoas, estes binómios entre o que devia ser e o que tem que ser que nos amarrotam aos poucos no interior de um saco de pancada em cujo revestimento se encontram coisas tão importantes como a dignidade e a honra, mas que acabam por ser substituídas por conceitos mesquinhos que se camuflam sob os pretextos inventados para as ignorar.
Mentiras piedosas, afinal, para mitigarem a infelicidade instalada pela suspeita, pela desconfiança e pela inevitável solidão que estas produzem.
 

No fundo, no fundo, sabemos que se mesmo com o desplante mentiroso desta sociedade de verniz dificilmente conseguimos enganar os outros, é (deveria ser) óbvia para qualquer pessoa a impossibilidade de nos enganarmos a nós próprios.

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