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CHARQUINHO

Sedento de aprendizagem, progrido pelos caminhos da vida numa busca incessante de espíritos sábios em corpos docentes. (sharkinho at gmail ponto com)

CHARQUINHO

Sedento de aprendizagem, progrido pelos caminhos da vida numa busca incessante de espíritos sábios em corpos docentes. (sharkinho at gmail ponto com)

23
Jan11

A POSTA NOS EMPREGADOS DE MESA

shark

Numa fase da minha vida em que prestava imensa atenção ao sobrenatural (para lá das miúdas, que sempre marcaram presença no centro das atenções) cheguei a acreditar nas predestinações, nos sinais premonitórios que nos alertavam para os perigos a evitar, talvez colocados por funcionários de juntas de freguesia já falecidos e ainda assim incapazes de deixarem por cumprir a função que lhes havia sido (pre)destinada.

 

Claro que também andei na catequese e o efeito prático foi o mesmo, este limbo da fé onde nada é credível e tudo pode de facto existir, inclusivamente as extraterrestres ricas capazes de tirarem um gajo desta vida.

E agora esta posta muda de rumo e pego por dois momentos deste meu dia cheio de gajas pequenas em casa (nos trabalhos de grupo a coisa é rotativa e hoje – ontem – tocou-me). O primeiro foi o da experiência eleitoral, da qual tenho o privilégio de ser quase um veterano pois pude votar logo que atingi a maioridade. O segundo foi ler esta posta do Valspirina que prendeu a minha atenção num aspecto específico por onde vou dar início à tal mudança de direcção deste texto.

 

Fui votar e pela primeira vez em mais de quinze anos a exercer o meu inestimável direito no mesmo local parecia que tinha a mesa de voto em Deadtown. A cidade fantasma, por acaso uma vila, provocou-me arrepios bem maiores do que os do frio instalado até à periferia do meu esqueleto de eleitor.

A segunda sensação estranha foi o contacto com os autómatos da mesa de voto, três, dois deles abaixo dos trinta. Nem um retorquiu ao meu sonoro “boa tarde”. O que julgo ser o presidente da mesa estendeu a mão para recolher os cartões, proferiu o número e o nome completo com voz de morto-vivo, deu-me o boletim de voto e nem por um momento olhou para mim.

E aqui entra o tal aspecto da posta do Val que me prendeu a atenção. Como ele, falhei dois ou três actos eleitorais enquanto membro das mesas. Cheguei a estar presente a pedido do PC, mesmo nunca tendo votado no partido.

Depois a coisa passou a ser a pagantes e nunca mais ouvi falar do assunto.

 

A imagem das três criaturas com ar enfadado de quem exerce uma seca de função remunerada agride-me desde que de lá saí. É penoso, para quem experimentou a pica da democracia em directo, com a malta de diferentes orientações ideológicas a torcer em conjunto pela chegada de mais eleitores, um sorriso rasgado de boas vindas a cada um, felizes por poder dar baixa de mais um das dezenas de nomes na lista que nos tocava.

E depois ainda vinha a cereja no topo do bolo, a contagem onde os presentes comunas vestiam de novo a farda vermelha e impunham um rigor que quantas vezes atrasava o fim da coisa por mais de uma hora por causa de um xis que ultrapassava dois milímetros os limites do quadrado e ficava logo suspeito de nulidade.

Era uma emoção despejar a caixa metálica preta sobre uma mesa da escola ou do pavilhão.

 

Agora é como vos descrevi, a animação de um balcão das Finanças mãos dadas com o ambiente típico de um funeral. E eu pensei logo no da democracia, a definhar por todos os lados às mãos destas aventesmas que nem possuem o alcance necessário para perceberem um momento extraordinário bem à frente dos seus narizes imbecis, emoções a flutuarem à deriva no meio das convicções e outras coisas importantes despejadas no vácuo no interior dos seus crânios sobre-dimensionados.

Alimárias, bem pagas e com direito a balda ao serviço no dia a seguir, contrariadas pelo privilégio de poderem viver um momento que só poderia engrandecer as suas formações pessoais que aos meus olhos tanto se revelaram necessitadas.

 

O sinal premonitório de que vos queria falar, mesmo já não ligando tanta importância a essas coisas, foi precisamente a notícia de que a presença nas mesas passaria a ser remunerada, numa prostituição descarada do voluntariado para estes serviços que constituem eles próprios um indicador da saúde de qualquer democracia.

 

E a nossa, coitada, está cada vez mais mal encarada.

4 comentários

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    shark 24.01.2011

    Compete-nos passar tão depressa quanto possível da fase de identificação das suas maleitas à da terapia de grupo...
  • Sem imagem de perfil

    Laura 24.01.2011

    Mas meu caro já há quem tenha (de forma clara acessível e sem qq raiva contida) diagnosticado os seus males! Basta ouvi-los ou lê-los ! Estou-me a lembrar por exemplo de Stefan Hessel (pode ouvi-lo no meu blog isto se não tiver preconceito em lá ir) ou Jean Ziegler (nos seus vários livros entre eles "L'empire de la honte" que nem sei se há traduzido mas de leitura fácil e accessível) ou então "Um mundo sem regras" de Amin Malouf! Se resolver ler depois diga-me o que pensou! ;)
  • Imagem de perfil

    shark 24.01.2011

    Fica assim combinado.
    (E que raio de preconceito haveria eu de ter?)
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